segunda-feira, 14 de fevereiro de 2022

O CASTELO DE PAPEL



Mary del Priore é escritora, historiadora e tem comprovado, em um sem número de vezes, seus dotes de comunicadora. Além disso, possui um currículo acadêmico extenso e de grande qualidade.

Por essas e por outras, resolvi ler o seu livro “O Castelo de Papel”, dedicado à metade final do reinado de D. Pedro II e baseado nas correspondências trocadas entre a Princesa Isabel e seu marido Gastão de Orleans, o Conde d’Eu, entre ela e o Imperador e entre o Conde e seu pai, o Duque de Nemours.

O retrato que daí sai é um quadro incisivamente crítico à Monarquia brasileira, e escancara sem muita piedade os erros, as omissões e a insensibilidade política de D. Pedro e de sua filha.

A segunda parte do século XIX foi especialmente desastroso para as casas coroadas em todo o mundo. O fenômeno social da industrialização veio criar, além de uma classe atuante de jovens empresários, um extenso proletariado. E nenhuma, ou quase nenhuma, casa reinante soube lidar com este novo ambiente de forma inteligente, preferindo arraigar-se às suas tradições, seu poder hereditário e apoiar-se numa aristocracia rural em franca decadência política.

No Brasil, esses novos ventos ganharam ainda mais alento, dada a circunstância de que a agricultura brasileira dependia fortemente do trabalho escravo.  Quando as novas ideias aqui chegaram, já agitações políticas e populares colocavam dois poderosos grupos em contínua oposição – os escravagistas e os abolicionistas. Dentro deste caldeirão, acabou por fermentar com rapidez o ideal republicano.

E é neste contexto temporal que Mary del Priore insere sua narrativa. Do que se depreende das cartas, tanto o Imperador, descrito por seu genro como um homem “cinzento”, como a princesa, não souberam, ou não quiseram, ler o futuro. Isabel é desenhada como uma mulher beata, domiciliar, mãe de família e totalmente desprovida de interesse pelos negócios de Estado. Seus períodos de Regência, quando das muitas viagens de seu pai à Europa, teriam sido para ela um grande desconforto. O marido, quando procurava participar da cena nacional, era rispidamente impedido pelo sogro, além de que hostilizado pelos opositores que nele vislumbravam intenções de tomar o trono.

Mesmo a assinatura da Lei Áurea pela princesa é creditada mais à insuportável pressão exercida pela intelectualidade e pela imprensa do que a uma sincera iniciativa de Isabel. Com o declínio físico do Imperador e o entendimento de várias camadas da sociedade brasileira de que sua filha seria incapaz de dirigir o país, a probabilidade de um Terceiro Império esvaneceu-se.

O meu problema é que o panorama pintado por del Priore colide com muita coisa que havia eu aprendido sobre o nosso segundo Imperador. Desde os bancos escolares que ouço dizer ter sido ele um monarca esclarecido, preocupado com o Brasil e com seu povo, homem de ciência e um governante capaz. É claro que não posso negar a veracidade dos testemunhos epistolares utilizados pela autora de “O Castelo de Papel” e nem desprezar seu magnífico trabalho de pesquisa.

Mas, será que isto não é só um lado da verdade?

 Oswaldo Pereira

Fevereiro 2022

12 comentários:

  1. Ainda que fossem só dois lados da verdade ... mas não, a verdade é inumerável e fugaz.
    Difícil é querer desentronizar
    Dom Pedro II, ainda mais, quando ele é "a cara" do seu avô, tão lusitano quanto, ou mais.

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    1. Sou fã do avô dele (vide meu texto aí ao lado). Mas, como tudo na História, há relatos e contra relatos. E a verdade... Ah! a verdade... como encontrá-la?

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    2. O avô de Pedro II quem é? Estava falando do meu avô
      Salvador Ribeiro. A cara de
      Dom Pedro rs tv ainda mais bonito e sedutor...heranças...

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    3. Rsrsrs... O avô de D. Pedro II era D. João VI, o Rei injustiçado...

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    4. Claro oh pá!. Pai de Pedro I !!!
      Olha q velha distraída estou me tornando.

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    5. Claro ! O pai de Pedro I.
      E eu nem tão ignorante assim, mas mto distraída. Gosto de todos eles.

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  2. Sugiro complementar sua leitura com o livro As Barbas do Imperador, da Lília Moritz Schwarcz.
    Abraços
    Graça

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    1. Obrigadíssimo, Graça. Estou mesmo precisando de um contraponto. Vou procurar o livro que vc indicou.

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  3. Mas, será que isto não é só um lado da verdade?
    Na verdade teremos sempre um,dois ou até mais lados de qualquer história, basta ver quem conta.
    A Verdade é um fruto muito doce de uma árvore muito alta dificil de alcançar.
    Zezé

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    1. Beleza de imagem, querida amiga. Com eu disse acima, não se encontra a Verdade com facilidade.

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  4. A coisa pública precisa sempre de alguém que a governe. Reis, Presidentes da República , Primeiros Ministros, etc. são um mal necessário. Ao menos enquanto não for ( se for ) viabilizada a utopia Anarquista ... O reinado de Pedro II pode não ter sido um brilharete, mas me parece que terá sido melhor do que muitos períodos republicanos. E olhe que eu sou republicano ! ...

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  5. tamebm pensava como voce sobre D.Pedro II, foi a influencia dos nossos professores de historia, que acho, erm todos monarquistas

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