domingo, 26 de abril de 2020

CRISES



Um dos conselhos que recebi de um dileto amigo, quando, há muitos e muitos anos, assumi o comando de uma grande empresa foi este. Procure sempre evitar a coexistência de duas grandes crises. Elas têm o poder de se alimentarem mutuamente.

Da saída de Sergio Moro do Ministério da Justiça, a minha primeira sensação foi de perplexidade. Por que agora? Por que justamente na hora em que o país atravessa uma grave crise sanitária e se prepara para enfrentar uma outra maior na Economia? Por tudo o que se sabe, o pomo dessa discórdia, ou seja, a permanência ou não de Maurício Valeixo no comando da Polícia Federal, já aparecia no radar do relacionamento entre Moro e Bolsonaro há mais de ano. Por que cargas d’água colhê-lo exatamente agora?

A segunda percepção foi ainda mais perturbadora. A de que um dos dois mais expressivos homens públicos brasileiros da atualidade, ambos reconhecidos e aplaudidos por terem um forte compromisso com a correção e a verdade, mente em horário nobre e perante todo o Brasil. Das declarações feitas à nação pelos dois, emergem duas informações conflitantes. Moro justificou sua demissão voluntária como um protesto ao que classificou de ingerência política na exoneração do Delegado Geral da PF por Bolsonaro. Este nega veementemente essa intenção. Bolsonaro acusa Moro de tentar barganhar sua possível aceitação à troca de Valeixo por uma indicação sua para o Supremo Tribunal Federal no futuro. Moro repudia enfaticamente esta informação. Para duas pessoas que, por suas próprias palavras, têm uma preocupação constante com a sua biografia, isto é péssimo.

Não sei, nem tenho como saber, com quem está a verdade. Para mim, até, nem interessa muito. O mais importante é o desastre que um acontecimento desta natureza agrega ao conturbado momento em que estamos. Um país parado, um futuro incerto e um povo intranquilo. Um abalo desta magnitude no comando político e institucional, na hora que mais precisamos de foco nos grandes problemas que temos pela frente, era TUDO o que não precisava acontecer.

Oswaldo Pereira
Abril 2020

24 comentários:

  1. Algumas das manobras típicas da doença mental (tipo paranoia, psicose, esquizofrenia) mto frequente nos déspotas e tanáticos,(vide Nero,Hitler,Mao,Caligula) é
    o distanciamento progressivo da realidade em busca de um poder incontestável. Isto está em curso desde o impeachment. E o que está por vir será talvez bem mais grave. Sendo assim, nada melhor para enfrentar o sintoma, do que espelha-lo com outra manobra bem arriscada, qual seja, "SAIR" tb, pelo menos temporariamente, da realidade. Ou então, jogar uma bomba na Casa Branca. rs

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  2. "... um dos dois mais expressivos homens públicos brasileiros da atualidade, ambos reconhecidos e aplaudidos por terem um forte compromisso com a correção e a verdade, ...":
    "Reconhecidos", acho que sim. "Aplaudidos", parece haver fortes controvérsias ...
    Abraços do Jaime Conde

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    1. Só para acender a controvérsia... Bolsonaro teve o "aplauso" eleitoral dos 56 milhões de votos que o elegeram. Moro, quando da sua atuação como juiz da Lava-Jato, foi celebrado, e ovacionado, com status de herói. Mesmo que a plateia esteja agora aquietada, no início da função ambos receberam seu quinhão de aplauso.

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  3. Quanto ao "forte compromisso", parece que nem fraco ...
    Jaime

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  4. Para quem não frequenta os recantos da política ficou inicialmente um sentimento de desânimo. A final Moro tinha um passado de respeito. Mas a forma como saiu, inclusive publicando conversas reservadas tanto com sua afilhada como com o próprio presidente deixou marcas muito sujas na sua defendida biografia. O que há por trás sera que alguém dia saberemo? De qualquer forma foi uma grande decepção.

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    1. Acho que a verdade, na política, tem muitas faces. Nenhuma delas verdadeira, é claro. Temos que tirar nossas conclusões observando fatos, caráteres e atitudes. Se Moro não vier imediatamente a público explicar o vazamento da conversa com a afilhada, vai ficar muito feio para ele. E aí, por consequência, cai por terra tudo o que ele argumentou em sua demissão.

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  5. Me parece q o que está em cena tem aspectos trágicos. De um lado o poder ilegítimo imposto por conspirações inexpugnáveis, do outro, o adoecimento do planeta como ja se esperava dp de alguns poucos séculos vivendo com o petróleo. Se outra ordem surgir, e acredito q seja possivel, teremos aprendido como diz Oswaldo algumas lições. Por enquanto o Cvirus está roubando a cena dos amiguinhos do Pato Donald, do juiz boa pinta e dos Irmãos Metralha. Sem duvida precisamos buscar outra literatura.

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    1. Exatamente! Outra literatura, outros textos e, principalmente, outros autores.

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  6. O Moro me decepcionou quando foi mordido pela Mosca Azul ao aceitar o convite para ser ministro.Depois me decepcionou ainda mais quando pelo menos foi ventilado desejar um cargo no STF e depois concorrer a presidência nas próximas eleições.
    Acho que o sapo como conta a lenda querendo ter o tamanho do boi de tanto inflar acaba explodindo.Ele acabou com a boa imagem que o pais tinha dele.Toda aquela exaltação sobre o trabalho e a pessoa dele sempre me chamou atenção, pois essa questão de ídolo é sempre complicada pois sendo totêmico é de barro ou seja quebra.
    Outra pergunta que me faço: Porque nesse exato momento? Ele nesse ano e meio no cargo foi por diversas vezes rebaixado pelo presidente, exemplo o COAF a não aceitação da Ilona Szabó pelo presidente entre tantas outras situações pelo menos desrespeitosas.Ele aparecia com aquela cara de paisagem como se diz agora e eu me perguntava: esse moço tem sangue de barata?
    Como sempre penso tem coisa grossa dos dois lados,mas será esclarecido?
    Quem será fritado?
    Não creio, pois os interesses pessoais, o poder e o dinheiro estão sempre nas contendas humanas.

    Abraços

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    1. Como eu disse acima, Zezé, a verdade verdadeira nunca aparecerá. Cabe a nós tirar conclusões do que vemos e ouvimos. Por exemplo: acho que Moro, independentemente de ter suas razões foi quem mais perdeu nesta affair. Ninguém se decepcionou com Bolsonaro. Ele continuou sendo o que sempre foi. Já o Moro... Além disso, Moro agora irá receber fogo cruzado. Já era odiado pela esquerda. Agora...

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  7. Quando o Paulo Guedes futuramente for "convidado" ou pressionado a sair do cargo, vamos ver Como ficará a opinião sobre o Bolsonaro. Mandetta, Moro, … todos os ministros "super-heróis" estão se despedindo do governo com adjetivos como traido, incompetente, mentiroso, etc. Será que todos estão errado. Só um está certo. A história se repete mesmo como se fosse um "negativo" do governo anterior. Tenho medo, muito medo pelo caminho que as coisas tem tomado no Brasil.

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    1. Que Bolsonaro é um chefe difícil, intempestivo e tumultuoso, ninguém nega. Quando primeiro vi o discurso de Sergio Moro, achei que era isto mesmo e que ele podia estar coberto de razões. Depois, vi Bolsonaro e constatei que alguém estava mentindo. Mas, duas coisas me fizeram sentir que talvez o "herói" Moro não seja bem isso tudo. Para já, o método correto de se pedir demissão é diretamente com o seu chefe direto e não em ato independente e público. Depois, a entrega a uma rede nacional de um conversa privada com alguém que você tanto preza, sendo até seu padrinho de casamento, pegou MUITO mal. Bolsonaro é o que é. Mas Moro parece uma coisa e talvez seja outra...

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  8. OU então os dois estão mentindo...

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  9. ...afinal, o que explica o cheque do Queiroz para a Michelle?

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    1. https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2020/01/23/perguntas-respostas-cheque-fabricio-queiroz-jair-bolsonaro-michelle.htm

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  10. ...o que aconteceu com a "gripezinha"?

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    1. Bem, a gripezinha continua sendo gripezinha, ou mesnos, para a grande maioria de infectados jovens e saudáveis. Estima-se que os casos não reportados do COVID-19, por serem assintomáticos e de leve consequência, são milhões no mundo inteiro. Os casos mais graves que uma gripezinha acometem os mais velhos e com doenças prévias. Por isso mesmo, muitos países já estão relaxando esta infame quarentena horizontal.

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  11. No meu círculo, que presumo bem mais reduzido do que o da generalidade das pessoas, contabilizo 17 identificados contaminados com diferentes graus de gravidade e dois mortos: um jovem de 42 anos e um velhote de 73 que todos diziam saudáveis até então ...
    Entre o "infame" proclamado por alguns que me parecem poucos e o "única alternativa" abraçado pelo que julgo ser a maioria, fico com esta. Decidiremos quando for possível escrever a crónica científica desta história. O que, no meu entender, entre outras coisas, significará calcular o índice de mortos face ao número de habitantes de cada país ou comunidade estudada. Os meus magros conhecimentos de matemática e estatística não se conformam com esse denominador "casos identificados", incerto e não sabido, em alguns casos um quase "ouvi dizer" ...
    Jaime

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    1. Caríssimo Jaime,
      O que estou tentando entender até agora é a diversidade de comportamento da pandemia em diferentes países e regiões. É claro que números podem ser politicamente escamoteados, mas com explicar a Índia versus a Lombardia, Suécia versus Nova Iorque? Por outro lado, sua contabilidade pessoal é extremamente significativa, porque verdadeira. O que sinto é que pouca sabemos ainda sobre o vírus. Haverá uma segunda onda? O mundo ficará livre da doença? Quando estaremos "seguros"? Mas, de uma coisa eu tenho certeza. Vamos entrar num período de depressão econômica muito séria. E isto afetará todos.

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