terça-feira, 28 de janeiro de 2020

PANDEMIA



"Anunciaram e garantiram que o mundo ia se acabar
Por causa disso a minha gente lá de casa começou a rezar... 
Acreditei nessa conversa mole
Pensei que o mundo ia se acabar
E fui tratando de me despedir
E sem demora fui tratando de aproveitar
Beijei na boca de quem não devia
Peguei na mão de quem não conhecia
Dancei um samba em traje de maiô
E o tal mundo não se acabou...
Ih! Vai ter barulho e vai ter confusão
Porque o mundo não se acabou".

Composto pelo genial Assis Valente, e cantado na voz de Carmem Miranda, o samba “E o Mundo Não Acabou” foi o maior sucesso do Carnaval de 1920. Embalando uma festa que ficou consagrada como um dos mais permissivos carnavais da crônica carioca (para o seu tempo), a música definia o sentimento da época em todo o planeta. O mundo acabava de presenciar duas inimagináveis catástrofes e a ideia prevalente era aproveitar o mais completa e rapidamente o fato de se ter sobrevivido, antes que outro apocalipse atacasse de novo. A Grande Guerra matara quase 10 milhões de pessoas. Mas a grande assassina havia sido a mais cruel pandemia de todos os tempos, desde a Peste Negra do século XV – a Gripe Espanhola.

Ninguém é capaz de precisar como ele apareceu, mas, no início de março de 1918, os primeiros casos de infecção com o vírus Influenza A subtipo H1N1 surgiram num acampamento militar em Kansas, Estados Unidos. O diagnóstico de um surto de pneumonia não impediu que as tropas embarcassem para o teatro de guerra europeu. Lá, num cenário de trincheiras lamacentas e de precária higiene, o vírus espalhou-se rapidamente. Em outubro, quase todo o Continente Europeu fora invadido pela doença, cuja letalidade era apavorante e não poupava nem soldados nem a população civil.

Até então, com os países ainda envolvidos no conflito e com os meios noticiosos sob rígida censura, a endemia era mantida em segredo. As nações beligerantes temiam que seus adversários tomassem conhecimento do alarmante número de baixas provocadas pela gripe. Só a imprensa da Espanha, que se mantivera neutra na Grande Guerra, estampava as manchetes sobre a avassaladora moléstia que ceifava cada vez mais vidas. Assim, a hecatombe passou a ostentar o nome de Gripe Espanhola.

Foram 50 milhões de mortes, só no Ocidente. Não há estatísticas sobre quantos morreram na China, no Japão, em todo o Extremo-Oriente. Por isso, há hoje estimativas de que o número total de vítimas fatais tenha chegado perto de 100 milhões.

Em 1919, a Gripe Espanhola chegou ao Brasil. Apesar de o vírus já estar em sua versão menos letal, ainda assim dezenas de milhares de brasileiros morreram. Muitos mais foram infectados, mas conseguiram sobreviver, como a progenitora do escriba deste moribundo blog. Mamãe tinha dois aninhos quando pegou a gripe. Sua salvação por um médico de Juiz de Fora, onde a família morava, sempre foi um ponto alto da nossa crônica particular.

Cem anos são passados desde o Carnaval libertário de 1920. Há ruídos de um outro vírus rondando o mundo. Mas, pelo menos, no século que nos distancia da Espanhola a Medicina evoluiu. Espero que o bastante para impedir outra catástrofe e permitir que, no Carnaval deste ano, possamos cantar alegres e confiantes: “E o Mundo Não Vai se Acabar”...

Oswaldo Pereira
Janeiro 2020
"

4 comentários:

  1. Oi querido Ozzy!
    Que números assustadores! Dá mais medo ainda desse corona. Pelo menos o Assis Valente nos dá um "alentozinho". Saudades de vocês. Beijo

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    1. Saudades também, querida Madá. Prontos para a "reentrée" no dia 6.

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  2. Deus o livre de ter replay... assusta...beijos

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    1. Vamos esperar que não. O alerta já foi dado e, pelo menos, há um esforço mundial para conter a epidemia.

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