segunda-feira, 8 de janeiro de 2018

DESTINOS CERTOS: O FIM DO MUNDO


A 12 quilômetros a oeste da cidade de Ushuaia, o Parque Nacional Tierra del Fuego é um dos lugares mais visitados da região. Dentro de seus 630 km², situa-se uma lindíssima baía, cujo nome, Lapataia, significa “baía do bosque”, no idioma dos índios yáganes. Na realidade, a baía é um fiorde da margem setentrional do Canal Beagle e marca o limite ocidental da fronteira entre a Argentina e o Chile. No caminho que leva às suas águas, num painel em madeira, está escrito o seguinte: “Aqui finaliza la Ruta no. 3 – Alaska 17.848 km.”  Para os caminhantes de todo o mundo, é um lugar de reverência. La Ruta no. 3 é o trecho final da Estrada Panamericana, cujo início fica no extremo norte do Continente. E é aqui que ela termina. No fim do mundo.

Vir para estes confins da Patagônia é uma viagem que atrai cada vez mais os turistas. De barco, como fizemos, ela começou em Santiago, uma capital abençoada pelos vinhos e pela brisa constante do Pacífico. Daí, é sempre para o sul, com as latitudes aumentando e os dias, neste verão meridional, também.

Dizem que descrever a Patagônia é tarefa para uma vida. Eu discordo. A verdade mesmo é que é impossível. O que a gente pode fazer é tirar centenas de fotos, selfies para convencer-nos depois que realmente estivemos lá, e tentar guardar na memória os poentes infinitos, as manhãs primordiais, os horizontes sem fim, as montanhas serenas e as noites estreladas. Em qualquer ordem...
Mas, para não deixar a minha dezena de leitores com uma ponta de frustração, aqui vão algumas breves anotações.

Puerto Montt
SALTOS DO PETROHUE

É a região dos lagos, com uma forte pincelada de arquitetura germânica. Se você estiver distraído, vai pensar que acordou na Baviera. Só que há vulcões por perto. O Osorno pode estar coberto de neve, mesmo no verão, mas não se engane. Sua classificação é ainda de vulcão ativo. E não deixe de ir aos saltos do rio Petrohue, onde o azul das águas e o branco das espumas oferecem um espetáculo deslumbrante de cascatas e corredeiras. Se ainda houver tempo, alugue um barco e dê uma volta pelo Lago Todos los Santos. Seu apelido é Lago Esmeralda. É só olhar para a sua superfície e perceber o porquê.

Punta Arenas
Aqui você chegou a uma página da história. Para aportar em Punta Arenas, é preciso entrar no Estreito de Magalhães. E, enquanto o barco singra placidamente entre as montanhas, sentir a saga do navegador português, indo rumo ao desconhecido e à glória em sua nau quinhentista. Mas, nem só de história vive o homem. É a hora e o lugar para saborear um must culinário destas plagas. Uma centolla, ou, traduzindo, a imensa santola que é um ícone da gastronomia patagônica...
ESTREITO DE MAGALHÃES

Ushuaia
A Terra do Fogo é uma imensa ilha, dividida entre Chile e Argentina. O Canal Beagle, de que falamos acima, banha a parte norte da ilha. Deve seu nome a um navio, famoso por ter transportado até aqui Charles Darwin e sua prodigiosa curiosidade. É uma região lindíssima. E esta, caros amigos, não dá mesmo para descrever. Sorry... Mas, contentem-se com esta foto que tirei, ao mesmo tempo em que saboreava a deliciosa cerveja feita aqui. E que também se chama Beagle...


Cabo Horn
Desde o século XVI até o advento dos grandes oceanliners modernos, a simples menção a este nome era o suficiente para gelar o sangue dos mais intrépidos marinheiros. O mau humor constante do tempo, as traiçoeiras correntes, os ventos assassinos e as rochas submersas fizeram do Horn um cemitério de navios. Cruzá-lo e sobreviver era tão raro que ao pirata que conseguisse passar incólume era concedida a honra de poder usar uma argola de ouro na orelha esquerda. No dia que atravessamos, o mar estava misericordiosamente manso. Mesmo assim, eu quero a minha argola...
CABO HORN












Falklands
Ou Malvinas. A disputa tem origem no século XVI e, até hoje, persiste. Da guerra de 1982 entre a Grã-Bretanha e a Argentina restam memoriais e minas ainda espalhadas em algumas praias. O perigo está mapeado e não atrapalha em nada um lindo dia de verão em Gypsy Cove, onde pinguins desfilam nas areias brancas com a solenidade de lordes ingleses em passeio dominical. Port Stanley, a capital, continua britânica até a medula, com direito a pub e fish & chips...

Puerto Madryn
A cidade é a porta de entrada para a fascinante Península Valdés, paraíso dos guanacos, das ovelhas, de mais pinguins e de leões e elefantes marinhos. Para vê-los, é preciso rodar horas entre estâncias espalhadas num horizonte totalmente plano e de vegetação baixa. É claro que vale a pena. Enseadas recortadas entre o mar cor de anil e rochas fossilizadas abrigam várias populações destes simpáticos animais do mar, cuja aparente ocupação principal é espreguiçar-se ao sol e posar para as nossas fotos.

PINGUINS NA PENÍNSULA VALDÉS



















Dias de 18 horas de luz, pôr do sol no mar, neve nos cumes, vales profundos, planuras até onde a vista alcança, paisagens que parecem recém-nascidas. A Natureza mostrando sua força e sua poesia. Isto é a Patagônia. Um destino certo no fim do mundo.

Oswaldo Pereira
Janeiro 2018


  





14 comentários:

  1. Hola Oswaldo, tu report es maravilloso, como siempre: me hace sentir como si hubiera estado allì con tigo.
    Un abrazo muy fuerte
    Gianna

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    1. Gracias, querida. Es una región verdaderamente increible.

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  2. Navegar é preciso. ..viver.....

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    1. ...não o é. O interessante desta frase é que o termo "preciso" não indica necessidade e sim exatidão, certeza, a indicar que a arte de navegar implica em fazer tudo certo. Assim me disseram. Assim eu acreditei.

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    2. Sim, será que eles tinham certeza ?Cabral mudou a rota por causa dos ventos.E,dizem que, achou o Brasil! Que já era conhecidos dos espanhois.
      Não podemos saber a verdade, eles queriam terras e será que tinham certeza ?Tudo pode ser.
      Fiquei encantada com esta terra descrita por você. Leio bastante e nunca tive vontade de conhecer, agora, estou quase de mala arrumada...Obrigada.

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  3. Sim, exato e necessário. A frase é de um português,né? Enquanto navegantes sabiam bem o que queriam na Terra e nos Mares tão vastos.

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    1. Vastos e nunca dantes navegados. Foram heróis numa dimensão que desafia palavras. O que os terá inspirado? Que vinho mágico terão bebido?

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    2. O vinho sem dúvida, a geografia e talvez o idioma. Uma língua sem a aspereza do espanhol. Com a doçura capaz de convencer o interlocutor, além das palavras.

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    3. A língua portuguesa é o seu maior legado. Existir um continente chamado Brasil que, embora cercado de "habla española", fala exatamente a mesma língua do Oiapoque ao Chuí, é o maior milagre de Portugal.

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  4. Seu descrever, contar e sentir é tão incrível que eu,
    jamais tivera vontade de ir para aquelas bandas e depois de tudo que li, claro, envolvida pelo sentimento que você sentiu e descreve saindo da alma, penso fortemente em conhecer este fascinante mundo. E, tão perto de nós.

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