FELIZ NATAL PARA TODOS!
E, para manter a tradição, aí vai o Conto de Natal deste Ano
Deu no New York Times.
Daqui a 100
anos, a inteligência artificial terá dominado a maioria das atividades humanas.
Os carros se conduzirão sozinhos. Os aviões também. Cem por cento das tarefas
industriais serão realizadas por robôs. Assim como as decisões empresariais.
Diagnósticos médicos serão feitos por máquinas, processos jurídicos preparados
por computadores e julgados por magistrados virtuais. Impressoras em 3D
eliminarão a maioria das entregas de mercadorias, a educação será ministrada
por androides didáticos, idiomas serão traduzidos instantaneamente por fones de
ouvido, o Facebook da época saberá tudo sobre nós. Com a programação genética
desenvolvida em hospitais totalmente automatizados, seremos jovens até a morte.
E,
provavelmente, o nosso melhor amigo será um computador.
Noel
olhou para o relógio. Fazia quinze minutos que esse fog estranho o tinha
apanhado entre a costa da Irlanda e o Canal da Mancha. No Weather Channel que consultara ontem, nada havia que indicasse
isto. A Noite de Natal seria de céu limpo, em todo o mundo.
E
agora, os ponteiros de seu Rolex giravam como loucos.
As
renas já estavam ficando nervosas, principalmente Rudolf e seu nariz vermelho.
Noel
resolveu abrandar e diminuir seu nível de voo, mesmo correndo o risco de cruzar
com algum avião também perdido naquela bruma. Tinha ainda muito para fazer,
milhares de presentes a entregar e, pelos seus cálculos, deveria estar apenas
no início do trajeto, algures sobre as Ilhas Britânicas. Mas, agora, com o
relógio enlouquecido e sem nada ver, sentia-se totalmente perdido.
Aos
poucos, umas pequenas luzes começaram a aparecer lá embaixo. Foi descendo,
lentamente, puxando as rédeas para que as renas fizessem uma aterrissagem
tranquila. Quando conseguiu ver melhor, verificou que era um condomínio de
casas absolutamente iguais. Ninguém nas ruas.
Pousou
com cuidado perto de uma das casas, sobre um relvado imaculadamente bem
tratado. Notou logo que as casas não tinham chaminés. E nem janelas. E agora? Iria ter de bater à porta.
Neste
instante, a porta abriu-se e um homem aparentando 40 anos saiu e veio
caminhando sorridente na sua direção. Estava bem vestido, cabelos
cuidadosamente penteados, os óculos discretos numa armação transparente, um
olhar franco e amistoso.
«Sim?»,
foi logo perguntando.
Noel
estendeu a mão.
«Boa
noite. Deve saber quem eu sou, não?»
O
homem olhou-o de alto a baixo, hesitando.
«Desculpe,
mas deveria saber?...»
Noel
estranhou.
«Bem...
O mundo inteiro me conhece. Papai Noel...»
O
outro continuou a olhá-lo, sem reação.
Noel
encheu os pulmões.
«Ho-ho-ho...
Então?»
O
homem ficou parado por uns segundos. Parecia que lia alguma coisa nas lentes de
seus óculos.
«Ah!
sim... Papai Noel... Uma lenda do passado...»
Voltou
a encarar Noel.
«Mas
aqui diz que você nunca existiu, que era uma figura mitológica criada pelo fabricante
de uma bebida intragável chamada Coca-Cola...»
Noel
interrompe.
«Quem
diz?»
O
outro responde.
«Ora,
o Facepedia que tenho na tela dos
meus óculos. Os seus não têm isso?»
Noel
segura as hastes de seus velhos óculos. Depois retruca.
«Pois
este seu Facequalquercoisa está mal
informado. Tanto é que aqui estou...»
O
homem percebe o mal-estar de Noel. Então diz, com simpatia.
«Mil
perdões. Mas, onde estou eu com a minha cabeça que não o convido para entrar. Por
favor, venha...»
Quando
entram na casa, Noel tem um choque. Ela está totalmente vazia. Não há móveis.
Nem tapetes, quadros, cortinas. Não há janelas. Nada. Só paredes nuas, numa cor
média. O dono da casa faz um gesto quase imperceptível. Imediatamente, mesas,
sofás, cadeiras, carpetes e quadros começam a aparecer, como que por mágica.
Ele vira-se para Noel.
«Novamente,
desculpe-me. Não esperávamos ninguém esta noite...»
Noel
está visivelmente desconfortável com a confusão mental que começa a movimentar-se
dentro de sua cabeça. Que diabos... Tentando
disfarçar, ele pergunta.
«Esperávamos?...»
O
outro dá um ligeiro sorriso.
«Ah!
sim, claro...»
Faz
outro pequeno gesto. E surgem uma mulher e um menino, ambos também
impecavelmente vestidos e arrumados. Ele apresenta, com visível orgulho.
«Minha
família...»
A
cabeça de Noel era agora um vendaval. Com dificuldade, conseguiu falar.
«Queiram
ou não queiram, eu me chamo Noel. Papai Noel. E esta é a Noite de Natal do ano
do Senhor de 2017. Não é?»
O
homem e a mulher se entreolham. Ele aproxima-se de Noel e pousa-lhe a mão no ombro,
conduzindo-o a um sofá.
«Sente-se,
meu bom velho»
Na
meia-hora seguinte, Noel descobre. Algum distúrbio celestial o havia afastado
de sua rota. Não muito no espaço, mas muito no tempo. Ele estava na costa
inglesa, sim, mas o ano era 2117. Cem anos à frente. O mundo mudara, demais. A
Inteligência Artificial dominara a planeta. O casal que o recebera explicara.
Tudo era agora virtual. Cidades, países, bens, desejos, sonhos. Ninguém
precisava mais de presentes, nem de Natal. E
vocês?, perguntara Noel. «Nós?», o homem respondera dando um risinho. «Nós
somos uma classe de programas avançados que imita a vida humana. Um software. Fomos desenvolvidos há mais de
50 anos pela IBMSoft, quando o cyberspace atingiu a supremacia na Terra.»
Noel
está cabisbaixo. Uma grande tristeza vai apoderando-se dele. O homem percebe.
«Não
se amofine. Volte para seu tempo. Eu posso recolocá-lo em sua trajetória
original de 100 anos atrás. Vá em paz»
Noel
sai da casa. Um futuro sem alma. Será
esta a nossa sina?, pensa, enquanto se dirige para o seu trenó. Então, uma cena
o surpreende. O menino está brincando com as renas. Beija-as, acaricia-as,
diverte-se com o nariz vermelho de Rudolf. Quando Noel prepara-se para subir, o
garoto o puxa pela manga do casaco. Seus olhos de criança brilham como estrelas.
Sua voz é doce.
«O
senhor vai voltar no ano que vem, não vai, Papai Noel?»
Noel
sente as lágrimas molharem seus olhos numa maré mansa.
Nem tudo está
perdido, pensou.
Oswaldo Pereira
Natal de 2017
Se quiserem ler os Contos de Natal dos anos anteriores, aqui vão os links.
https://obpereira.blogspot.com.br/2016/12/e-natal.html
https://obpereira.blogspot.com.br/2016/12/e-natal.html
https://obpereira.blogspot.com.br/2015/12/natal-2015.html
https://obpereira.blogspot.com.br/2014/12/feliz-natal.html
https://obpereira.blogspot.com.br/2013/12/e-natal.html
https://obpereira.blogspot.com.br/2014/12/feliz-natal.html
https://obpereira.blogspot.com.br/2013/12/e-natal.html
Adorei esse conto, Oswaldo. Principalmente o final. Feliz 2018 para vocês - ou 2118, como preferirem...Bjs
ResponderExcluirRsrsrs... Obrigadíssimo, Ana. Paz e saúde para os próximos cem anos...
ExcluirÉ verdade Oswaldo, acho que a tecnologia nunca irá matar o que de humano existe em nós. É nossa única esperança. Um grande abraço e muita luz e paz nesse Natal.
ResponderExcluirObrigado Zé. Viva a Esperança!
ExcluirPensando no futuro...gosto da última parte! Belo conto !
ResponderExcluirPaz e felicidade para o ano que já aí está!Um abraço.