quarta-feira, 11 de agosto de 2021

A RELATIVIZAÇÃO DO BOM-SENSO

 


O que é Bom-Senso?

Em meus devaneios, sempre me pareceu que bom senso era uma coisa auto evidente, reconhecível in loco, claro e indiscutível como o sol, uma verdade insofismável que não admitia circunlóquios ou tergiversações.

Mas estou percebendo que minha romântica visão, tão solene e antiquada quanto os adjetivos acima, está lamentavelmente ultrapassada. E, mesmo se fosse buscar seu correspondente na língua inglesa, common sense, tenho de admitir que ela não tem mais nada de common.

Sujeito a interpretações, escrutínios analíticos e ideologias de variada espécie, a figura antes monolítica do Senso Comum caiu na vala da relatividade.

Isto tudo me veio de repente com a questão do voto auditável.

Na minha proverbial ingenuidade, eu cria ser de bom-senso, já que existe uma razoável dúvida quanto à higidez do sistema de apuração de votos hoje em uso no Brasil; o fato de que esse sistema permanece com a mesma estrutura informatizada do tempo de sua criação, há mais de 20 anos; a percepção geral de que, atualmente, NENHUM sistema pode garantir sua imunidade ao ataque de hackers; e que TODOS os países (à honrosa exceção do Bangladesh e do Burkina-Fasso) que porventura utilizaram sistema semelhante no passado já o dotaram de uma ferramenta suplementar de controle, como o comprovante impresso, aceitar que estava na hora de rever os nossos métodos de votação.

Também não consigo discernir fundamento lógico quando afirmam que inserir um comprovante adicional ao mais importante ato da nossa claudicante democracia seria um passo atrás, quando eu me convenço que seria um passo à frente, um avanço e uma segurança necessária.

Então, nesta hora em que o Congresso brasileiro sepulta uma pretensão que julgava eu legítima, racional e indiscutível, aqui me quedo, desconsolado e inseguro, a verificar que um dos deuses supremos de minha racionalidade, meu querido e inabalável bom senso, é apenas uma miragem, uma visão, um sonho juvenil, indefeso nas mãos da vontade política de uns quantos.

 Oswaldo Pereira

Agosto 2021

13 comentários:

  1. Eventualmente dis-se q a lucidez cega! Mas o pior de tudo, são os tais "uns quantos" que a rigor não são identificáveis. Vivemos visivelmente à mercê de uma forma de cegueira.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Sabemos quem são os "quantos". Mas, na atual conjuntura, nada podemos contra eles. Ou será que podemos?

      Excluir
    2. Não é lá mto fácil ignorar aquilo que não aprovamos. Podemos, ainda que relativamente distanciarmo-nos. Medida cautelar contra o contágio, uma...quase digamos,desalienante espécie de esquizofrenia branda, jogo de cintura, para aturar esse detestável mundo louco.

      Excluir
  2. Gostaria que fosse feita uma pesquisa para identificar o percentual de cidadãos que, com os detalhe comprovatórios, são capazes de evidenciar ter entendido o que, no meio das axiomáticas afirmações ( o sistema de votação e apuração é / não é vulnerável à fraude ) de um e de outro lado, se discutiu ao longo destes últimos tempos ...
    Empíricamente, determinei que menos de 5% estavam bem informados do que se tratava ...
    Relembro "página" do jornal cinematográfico de atualidades da minha infância: "Assim caminha a humanidade" ...

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Caro Unknown, achava eu que se tratava apenas de uma questão de bom senso. Mas, também empiricamente, verifico que bom senso e política nada têm a ver um com o outro...

      Excluir
  3. As estrelas do filme, eram Rock Hudson,Elizabeth Taylor e o petróleo ⛽, mas a história mesmo ficou esquecida.

    ResponderExcluir
  4. Bem posta, clara e direta a questão do bom senso, acho que ele continua exatamente com seu conceito tradicional, mas é adaptável à coisas que nao nos são evidentes e, não estando à vista a olho nu, não é do feitio acreditarmos no que não vemos. Esse "bom senso perdido

    ResponderExcluir
  5. ... como dizia, esse "bom senso perdido" nada mais é do que o resultado de fake news de países para lá de desqualificados que adotaram mas também têm-no escrito. Na verdade 21 países já o adotam e esse terceiromundismo a que nos afeitamos é um complexo que no campo tecnológico nao funciona. O Avião é invenção nossa. O Brasil é o único país subdesenvolvido que faz parte da União de Paris de Marcas e Patentes desde 1850 pelas mãos de D. Pedro II. As grandes pesquisas e vacinas são brasileiras. Daí derivam todas as soluções e as que parecem de bom senso são exatamente de péssimo senso. O bom senso continua. Nós é que nos apegamos numa era que nos pertence e está ultrapassada com entulhos de preconceitos.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Muito bom, caro Lustosa. Temos jabuticabas boas, mas outras têm sabor amargo...

      Excluir
  6. O grande obstáculo para o voto auditável ser aceito foi o interesse de Bolsonaro no assunto. A implicância generalizada contra tudo o que o presidente aprova (haja vista cloroquina e ivermectina, entre outros) é a senha para se votar contra. Haja saco!!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Bolsonaro podia ter ganho esta fácil. Era só dizer que era contra o voto auditável...

      Excluir