domingo, 28 de abril de 2019

DÚVIDAS EXISTENCIAIS




Depois de uma certa idade, a vida parece escorrer. Passados os tsunamis da adolescência, as marés vivas da juventude e as procelas e bonanças da maturidade, a última idade chega com seu marulhar constante, em que apenas percalços de saúde podem estremecer o regular fio d’água do dia-a-dia.

Assim é, e assim deve ser. Faz parte do roteiro que nos foi imposto por um deus severo, que escamoteou o grande desejo da criatura por ele mesmo criada. A perpetuidade. Definidos como finitos, vivemos nossos ciclos. Na melhor das hipóteses, conseguimos viver todos eles. Nascimento, crescimento, apogeu, declínio e morte.

Não sei como será nos outros planetas, mas posso adivinhar que esta lei vale para todos os seres existentes no universo. Tudo o que há, mais cedo ou mais tarde, deixará de haver. Por expansão ou por regressão, seremos apenas capítulos de uma gigantesca história, cujo propósito escapa ao nosso entendimento.

É claro que há, dentre nós, os que não se deixam inquietar com isto. Abençoados por uma fé religiosa, creem nas decifrações desse propósito e entendem que este universo, todo ele, nada mais é que a preparação para uma eternidade em outro plano, aí sim o destino final do ser inteligente. Daí pode inferir-se que só os seres capazes ter esperança, ou seja, somente os homo sapiens, ou que nome tenham pelas galáxias afora, poderão lá chegar.

O problema é quando você é dotado de discernimento bastante para esperar, e não crê nas explicações da fé. Assim, a certeza da finitude parece uma grande injustiça. Por que me deram as asas do sonho, se me proíbem de voar? Por que me foi dada a visão da eternidade, se jamais lá chegarei?

E aí, as coisas complicam ainda mais. Injustiça é um ato. E um ato exige um agente. Quem? Todas as religiões têm o mesmo nome para ele. Então, ou você admite Deus, ou terá de se conformar com a suprema aleatoriedade de tudo.

Dá para dormir com um barulho destes?

Oswaldo Pereira
Abril 2019



4 comentários:

  1. Você é um filósofo.Ou é o querer viver o outro lado da vida.Não vejo , não tenho certeza apezar da força que faço para acreditar ter um outro lado da vida.
    Deus, este ser invisível, só ele nos dá esta esperança de uma outra vida, mas ele não fala, ele não mostra, e pergunto, porque sentimos essa outra vida depois de passarmos por esta ? Seria muito bom encontrar os queridos que , juntos participamos de anos maravilhosos, esperanças, amores, estudos, sonhos, aventuras,e todo o querer realizado.Nosso Deus, o ser invisível,estaria lá a nos esperar???Como estaria cansado! São milhares e um só Deus, que nos protege, os milhares!

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    1. Às vezes, tenho inveja de quem tem fé. Mas, como você, também me falta uma prova mais evidente desta outra eternidade...

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  2. Ainda que eu acredite que há um outro lado, neste momento quero apenas pensar no aqui e agora. Estou certa que meu momento final está definido e de nada adiantará eu me preocupar com ele. Mas acho que sempre é válido divagarmos sobre o "como será?" rsrs. Grande beijo primo. Adoro seus textos...

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    1. Brigadíssimo, querida prima. Já que não temos a certeza de quando será, o melhor é ir aproveitando e bebendo bons vinhos...

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