sexta-feira, 28 de junho de 2013

FIESTA




CAPA DA PRIMEIRA EDIÇÃO

















Parataxis é uma forma de escrever que coloca duas sentenças em igual plano, sem subordiná-las. A correlação vai ser feita por quem lê. Exemplo:
O sol estava brilhando. Saímos para passear.
Em vez de
O sol estava brilhando, e então saímos para passear.

Parataxis também é conhecida como a Teoria do Iceberg.

Foi assim que Ernest Hemigway descreveu seu próprio estilo literário, no livro “Death in the Afternoon” (Morte ao Entardecer), em que ele o compara à dignidade do movimento dos blocos de gelo sobre o mar. Sua característica principal é a de descrever o mínimo, dizer o essencial e deixar ao leitor a tarefa de descobrir o que está debaixo da linha d´água.

O estilo, também conhecido por Teoria da Omissão, ficou evidenciado logo em seu primeiro romance. The Sun Also Rises (O Sol Também se Levanta) foi escrito em dois meses, no ano de 1925. Antes de sua publicação, Hemingway ainda fez uma última revisão e cortou 30 páginas do texto original. O resultado foi um livro seco, cru, onde os onipresentes diálogos pintam o dia-a-dia de expatriados americanos e ingleses na Paris dos loucos anos 20 e a viagem de um grupo deles a Pamplona, para a festa de San Fermín. Inicialmente, o escritor intitulou-o Fiesta, em razão das celebrações impregnadas de tradições tauromáquicas que permeiam a narrativa. Depois, adotou uma citação do Eclesiastes para resumir a filosofia fatalista das principais figuras do texto. Independente das vontades, o sol se põe e também se levanta todos os dias.

HEMINGWAY & AMIGOS EM PARIS

No que foi aclamada como a primeira obra modernista da literatura americana, o autor utiliza sua própria vivência como correspondente do Toronto Star na capital francesa como enredo e as pessoas com quem convive como modelo para os personagens. O que sai é um retrato quase fotográfico da Lost Generation, a geração perdida de Gertrude Stein, que incorporou o nihilismo do entre guerras na Europa. Mutilada fisica e moralmente pelo conflito terminado em 1918, a juventude desencantou-se de futuros e de promessas e criou um mundo sem propósitos, uma religião do viver por viver e seus próprios deuses, como a indiferença pela morte, o absinto e o sexo casual. No fundo, um prelúdio do apocalipse que viria em 1939.

Muito devido a Hemingway, essa Paris enlouquecida inspirou uma multidão de pintores, escritores e compositores. E continua a fazê-lo, como a Woody Allen, no recente Midnight in Paris. Há alguns anos, outro Allen, o músico australiano Peter Allen, retratou-a na estranha e magnífica canção Paris at 21, uma ode à miragem de viver na cidade em 1921 com 21 anos.

Com pouco mais de 200 páginas e texto enxuto, lê-se O Sol Também Se Levanta rapidamente. Acho que a intenção do autor era exatamente esta. Ao terminar, entretanto, fiquei esperando por uma revelação. Afinal, era Hemingway! Deixei passar um dia, dois, para ver se, como um bom vinho reserva, os sabores escondidos pelos anos aflorariam na boca lentamente, encantando-me com os mistérios de sua história. Nada disto aconteceu. Do livro ficou apenas a sensação de ter lido um diário de viagem linear, uma visão pessoal e quase jornalística das experiências de um grupo de amigos pelos bistrôs de Paris e pelas ruas de Pamplona. Da parte submersa do iceberg, nada apareceu.

Sorry, Papa.
 
 
Oswaldo Pereira
Junho 2013

 

 

 

 

 

Um comentário:

  1. Muito saudavel mudar de assunto. Principalmente pra substituir a politica no Brasil por um ¨papa¨ expert em glamour, ainda que para desentroniza-lo com leve ironia.

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