terça-feira, 14 de maio de 2013

PORTUGAL E O MAR







Destino. Para usar uma palavra ícone, Fado.
Foi para ele que Portugal esteve fadado, desde o nascer.  O Mar.

De leste, o país sempre foi abraçado pela Espanha. Castela e León o espremeram logo após o berço, depois de um parto a ferros obrado por Afonso Henriques na mesopotâmia lusa entre o Minho e o Douro. Estabelecida a precária fronteira no nascente, Henriques e seus sucessores rumaram para o sul, ceifando os muçulmanos e abrindo um corredor estreito entre o litoral e as montanhas andaluzas, até, em meados do século XIII, parar nas praias dos Algarves. Um retângulo cuja independência ainda se equilibrou cambaleante entre desuniões familiares e conspirações castelhanas até sua definitiva confirmação na batalha de Aljubarrota, em 1348.

Nação formada, língua oficializada, rei posto. E agora?

Não havia para onde ir a levante. As terras de Espanha, e mesmo o continente todo, pareciam querer forçar o novel reino para fora, expeli-lo do mapa da Europa, empurrá-lo para o precipício do mar. E foi nesse momento que Portugal descobriu sua vocação, sua alma. Seu Fado.

João de Avis, o rei, dá início a uma fulgurante dinastia. Ela será breve, mas iluminada pela visão da linha do horizonte além das ondas, de um mundo apenas adivinhado para lá do sol poente e inspirará os homens de aço que tripularão seus navios na mais arrojada empreitada da história náutica – a era dos Descobrimentos.

A partir daí, o mar domina. Ele será o provedor, o deus das fortunas, o arauto da glória, a base do poder. Tudo dele vem. E para ele vai. Vidas, sonhos, esperanças. Até o final do século XVI, Portugal expandirá seu império do Brasil à Polinésia, cobrindo mais do que o mundo conhecido, criando feitorias, ensinando o catecismo e praticando a sublime arte da miscigenação.

Em 1580, D. Sebastião desaparece nas brumas de Alcácer-Quibir e o sonho acaba. Mas, o Mar Oceano não perde sua magia e sua importância. Recolhidas as naus das descobertas, os pesqueiros lançam-se às águas e fazem florescer uma atividade econômica, ao mesmo tempo determinando hábitos comestíveis que até hoje fazem dos portugueses os maiores consumidores per capita de peixe do ocidente. Sem falar que, já em 1497, seus barcos caçavam, nos bancos da Terra Nova, o pescado símbolo da culinária lusa – o bacalhau.

Mulheres vestidas de negro nas areias da Nazaré, esperando seus homens voltar. Centenas de canções invocando cenas de maresia, gaivotas e fragatas. Um cacilheiro lentamente atravessando o Tejo. Um rabelo singrando o Douro.  Tudo isso é o mar.
De que Fernando Pessoa escreveu:

“Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal...”

E, falando em Pessoa, aproveito para relembrar o que escrevi  há tempos, no link a seguir.

Oswaldo Pereira
Maio 2013




Um comentário:

  1. Comovente! Exatamente porque, apesar do cenário bem desenhado de um Portugal das antigas, nota-se no texto uma "impaciência", exata, para equilibrar o sopro nostálgico.

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