Se você estivesse aqui, pelos idos de 1650 a.C., teria vivido numa das mais deslumbrantes ilhas do mar Egeu. O lugar era chamado de Strongyle, a redonda ou Kallisté, a mais bela, em grego. A cultura minóica, absorvida da vizinha Creta, florescia em seus palácios magníficos, cobertos de afrescos mostrando cenas rupestres e figuras humanas longilíneas e elegantes. Strongyle era um rico entreposto do império comercial cretense e em Akrotiri, sua cidade principal, viviam mais de 30.000 pessoas.
Certo dia, entretanto, você teria acordado para ver uma
chuva fina de cinzas caindo lentamente sobre a ilha. O fenômeno durou alguns
dias, alarmando a população. E servindo de aviso. Rapidamente, providenciou-se
a remoção dos habitantes, provavelmente para Creta, 70 milhas náuticas para o
sul. Você teria partido triste, por ter abandonado sua linda cidade e por ter
também saído de mãos limpas – dada a urgência da retirada, todos os pertences
haviam ficado para trás.
Sorte sua. Dias depois, a mais catastrófica erupção
vulcânica da história fez desaparecer toda a parte central de Strongyle, ejetando 30 km³ de magma e
levantando uma coluna de fumaça e detritos que podia ser vista por centenas de
milhas ao redor. Seus efeitos foram mais poderosos que o de cem bombas
atômicas. Uma cortina de fumo encobriu o sol por várias semanas em boa parte do
mundo e tsunamis gigantescos atingiram os litorais de toda a região.
O terrível desastre deu início ao declínio da civilização
minóica, uma das mais importantes da Idade do Bronze. E é mote inspirador de
várias teorias. Uma delas atribui à erupção a passagem bíblica da travessia do
Mar Vermelho pelos judeus. A retração da maré antecedente ao tsunami teria
abaixado o nível das águas, permitindo a Moisés e seus seguidores cruzarem em
segurança. A chegada da grande onda teria afogado as tropas de Ramsés. Outra,
mais conhecida, estabelece uma correlação entre a ilha redonda e a descrição
feita por Platão de outra ilha, também redonda, chamada Atlantis, alimentando o mito da lendária Atlântida.
Depois do cataclismo, o mar penetrou na boca do vulcão e
criou uma lagoa cercada pelo que restou das paredes do cone vulcânico. Do fundo
do lago, camadas de lava derretida e solidificada foram-se acumulando e uma
ilhota de solo escuro emergiu no centro. Aos poucos, os escombros foram sendo
reabitados. Lacedemônios, Fenícios, Bizantinos. A
denominação da ilha também mudara, para Thira
ou Tera. No século XIII chegaram os venezianos. Devotos de Santa Irina,
renomearam o lugar.
VISÃO 3D DE SANTORINI |
SANTORINI
Em Fira e Oia, as casas ficam encarapitadas nas bordas de um
precipício de 300 metros. Lá embaixo, a caldera
do vulcão, cheia de água. Você até se pergunta. Que motivo leva as pessoas a morar num lugar como este?
Resposta: basta chegar à janela. A espetacular vista tira o
fôlego, ao mesmo tempo em que algo sussurra que você está num dos pontos mais encantadores do planeta.
Aqui, é a Grécia dos sonhos. O casario branco com seus domos azuis, a festa das flores em abundância, o céu mitológico. Não há ruas retas,
nem sinais de trânsito, nem asfalto negro. São intrincadas vielas que sobem e
descem, lojinhas charmosas vendem artesanato, roupas e lembranças. O importante
é andar sem rumo, sentando aqui e ali para ver as cores, ouvir os sons, saborear a maresia.
Quando vier, venha de barco. A entrada na baía, a vista das
duas vilas encasteladas no alto do imenso paredão circular, o índigo profundo do
mar valem várias vezes a passagem e as horas de travessia desde o porto do
Pireu.
Também não deixe de visitar a pequena ilha de pedras negras
que se situa no meio da lagoa. Chama-se Nea Kameni. A paisagem lunar ainda
fumega e relembra que ali, a alguns quilômetros abaixo, lá nas profundezas,
câmaras de magma ainda fervem. O monstro, como um apocalíptico titã adormecido,
apenas repousa.
E, definitivamente, não perca o pôr do sol. Vai ser difícil
ver outro igual. Como será difícil encontrar outro lugar tão mágico como
Santorini.
Oswaldo
Pereira
Maio 2013