segunda-feira, 26 de agosto de 2013

AGOSTOS


 
 
 
 
Há dois Agostos.
Neste prá-lá-prá-cá da minha vida, dançando entre os dois hemisférios ao sabor das marés e dos desígnios, vivo os dois. E dá para perceber que este é o ponto do calendário em que a disparidade das estações trocadas mais revela seu paradoxo geográfico. Solares ou glaciais. Não há meio termo.
 
No setentrião, no verão modorrento que marca o mês, uma brisa morna costuma acariciar as velas. Em qualquer tarde estendida no tempo, um barco segue, rumo ao mar, sua silhueta elegante e branca deslizando no azul profundo, fiel ao rumo traçado em seu timão, vento e leme definindo seu destino, seu futuro. Nas praias coloridas pelas gentes, as dunas suspiram, aspergindo sua areia fina e quente, assumindo as novas formas que o nordeste brando lhes desenha. Na beira d'água, fluxo e refluxo brincam em seu vai vem infinito, sem pressas e sem invenções, imutáveis e impassíveis. O sol demora a ir-se deitar, espreguiçando num céu infinito. Que azul é esse?... Me pergunto às vezes, duvidando das lentes de meu ray-ban. Sol, sal e céu, à espera de um setembro ainda insuspeitado, ainda atrás da linha do horizonte. São dias vividos com a intensidade da luz forte que tudo promete, menos durar para sempre.
 
 
Abaixo do Equador, é chuva fina. São poentes doloridos, longínquos em sua tristeza púrpura, recebendo a noite que chega cedo. O sol trabalha pouco, descumprindo horários, faltando com frequência ao serviço por dias a fio. O tom é menor, o brilho escasso, o vento gélido. É tempo de cobertor enrolando uma tarde escura e melancólica, de ruas molhadas e desertas. Sem o alento de um céu claro, as almas procuram a si mesmas para companhia. É tempo de introspeção. Mas, como ninguém gosta de sofrer continuadamente, há atenuantes maravilhosos. Chocolate quente, uma panela de substância no fogo lento, um vinho despejando seu carmim nobre em taças guardadas por meses; o ar fino que afasta a preguiça mole do verão que se foi, uma sinfonia tocando baixinho no silêncio das janelas fechadas. E a certeza de que o mau tempo, também ele, não durará.
 
 
Oswaldo Pereira
Agosto 2013
 

Um comentário:

  1. É, Oswaldo, sua crônica nos faz enxergar as diferenças, nosso olhar vê o que acontece , há realmente dois agostos.
    Abraço,
    Cleusa.

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