250.000 PESSOAS EM FRENTE AO LINCOLN MEMORIAL |
O dia 28 de agosto de 1963 marcou a cerimônia de encerramento de um movimento popular nos Estados Unidos denominado March on Washington for Jobs and Freedom (Marcha sobre Washington por Empregos e Liberdade). Iniciada na Georgia, a marcha deslocou centenas de milhares de manifestantes, na maioria negros, ganhando adeptos ao longo do caminho até que, ao chegar à Capital, reunia mais de 250.000 pessoas. O foco da demonstração era o protesto contra a situação do negro na sociedade e a constatação de que, exatos cem anos após a Emancipation Proclamation (Proclamação de Emancipação, equivalente à nossa Lei Áurea), os indivíduos de cor diferente da branca ainda sofriam com uma brutal discriminação da linha Dixie para baixo (ou seja, o sul dos Estados Unidos). Eram obrigados a sentar nos últimos bancos dos coletivos, não tinham acesso às melhores escolas, aos melhores empregos; eram barrados em clubes, bares, restaurantes. No Mississippi, nem direito a voto tinham. A melhor parte do milagre americano lhes estava negada pelos sinais de Whites Only (Só para Brancos).
O
evento constituiu-se de uma série de discursos dos líderes do movimento para a
imensa multidão espraiada em frente ao Lincoln Memorial, local escolhido por
ter sido Abraham Lincoln o grande campeão da causa da libertação dos escravos.
Foram dezesseis oradores. Mas foi o último a falar que marcou para sempre o
dia. A oração de Martin Luther King Jr., já conhecido no país todo como figura
emblemática das pretensões de sua raça, passou à história como o mais
inspirador discurso americano do século XX, eternizando-se como o I Have a Dream Speech (Discurso do Eu
Tenho Um Sonho).
O
texto lido pelo Reverendo King já era singularmente empolgante, mas a
dramaticidade de sua voz multiplicou o efeito várias vezes. Lançando mão de
várias anáforas, isto é, a repetição de algumas frases incitantes, como now is the time (agora é a hora), we can never be satisfied (não poderemos
jamais estar satisfeitos) e let Freedom
ring (deixe a Liberdade soar) e citando trechos da Declaração da
Independência e da Constituição, King eletrizou a audiência. Já estava chegando
ao final do texto quando aconteceu o raio mágico que distingue a mera revelação
de uma divinal epifania. Foi quando a cantora Mahalia Jackson gritou da
multidão: Tell them about the Dream,
Martin (Conte-lhes do Sonho, Martin).
O
Reverendo abandonou a leitura e começou a improvisar sobre o tema, repetindo a
frase I Have a Dream e descrevendo o
seu sonho, uma ode sobre a liberdade, a tolerância, a igualdade perante a lei e
a vida, a esperança de um povo, o orgulho da cor, terminando com o arrepiante
grito sobre a promessa que via no futuro: Free
at last, good God Almighty, free at last (Libertos enfim, Bom Deus Todo
Poderoso, libertos enfim). Esta é a parte do improviso final:
Martin Luther King foi assassinado em 1968. Mas hoje, cinquenta anos depois de seu sonho, Barack Hussein Obama, um negro de nome árabe, é o Presidente dos Estados Unidos.
Oswaldo
Pereira
Agosto 2013