A
cidade está em ruínas. O Portão de Brandenburgo ainda resiste de pé, mas, atrás
dele, todos os prédios da Siegesallee, a majestosa Avenida da Vitória, estão destruídos. A Praça Potsdam
perdeu os graciosos contornos que circundavam o edifício da Chancelaria e nada
mais é do que um cemitério de paredes desabadas. Até onde a vista pode
enxergar, o que sobrou foram estruturas ocas onde só as empenas desfiguradas
ainda se erguem para um céu descolorido, vazias e trágicas em seu silêncio sem vida.
As
pessoas, entretanto, resistem. Em teimoso desafio, buscam uma razão para
continuar vivendo, depois que a morte e o desespero as rondou por tanto tempo.
Fazem fila para resgatar a pouca água que ainda resta, andam a pé ou de
bicicleta para fazer ressurgir algum ofício, encontrar alguma comida,
abrigar-se à noite. Quase só há velhos, mulheres e crianças. Têm o olhar duro.
Os velhos não sabem explicar como escaparam enquanto uma juventude inteira
desapareceu. As mulheres são viúvas e foram, em sua maioria, estupradas por
conquistadores sedentos de vingança. As crianças são órfãs. Nada esperam. Em
Berlim, é maio de 1945. Para a Alemanha, é o Ano Zero.
Há setenta anos, no dia 8 de maio, a sede da
Administração Militar Soviética, uma construção cinzenta no centro de Berlim, ocupada dias antes
pelos russos, foi palco do capítulo final da maior hecatombe a se abater sobre
o solo da Europa em toda sua história. Pouco antes da meia-noite daquele dia,
três marechais, o alemão Wilhelm Keitel, o inglês Sir Arthur Tedder e o russo
Georgy Zhukov assinaram o termo de capitulação dos exércitos germânicos em toda
frente ocidental da Segunda Guerra Mundial. Foi a segunda parte de uma
cerimônia semelhante ocorrida no dia anterior em Reims, na França, com a
presença dos generais Alfred Jodl e Walther Bedell Smith. Os canhões
continuariam a atirar e as bombas a cair, mas longe dali, no Extremo Oriente,
onde o Império Japonês agonizava. No continente europeu, no entanto, era hora
de contar os mortos, recuperar os feridos, reconstruir a vida.
O MARECHAL KEITEL ASSINANDO A RENDIÇÃO |
Para além da outrora orgulhosa capital do Terceiro Reich, as cenas de cidades reduzidas a
esqueletos de pedra e ferro retorcido multiplicavam-se aos milhares, na
Alemanha, na França, na Bélgica, na Holanda, na Inglaterra, na Itália, na
Áustria, na Polônia, na União Soviética. Sessenta milhões de mortos, entre
soldados e civis, em cinco anos, oito meses e sete dias de luta. Ainda hoje os
números assustam.
Quando terminou a cerimônia e a notícia ganhou as
manchetes dos jornais, uma explosão de regozijo pôde ser ouvida de Moscou a Los
Angeles. O riso franco do alívio e as lágrimas da alegria desenharam em milhões
de rostos a esperança de que isto não mais se repetiria. Nunca mais. O preço
fora alto, muito alto. A lição tinha de
ser aprendida, para sempre.
Pois é. Todos nós sabemos a continuação desta história. E ficamos repetindo Bob Dylan: Oh When will they ever learn...
Oswaldo
Pereira
Maio
2015
Não aprendemos.......alguns alegam que as guerras se fazem necessárias para conter o excesso de população, ou renovação cultural.......cruéis ou realistas sua visão tem eco em todos aqueles que as incentivam criando angústia em outros que são da Paz.....
ResponderExcluirOi Oswaldo
ResponderExcluirPor acaso estou aqui na França onde o dia de hoje é feriado em comemoração ao fim da segunda guerra, mas como você mesmo disse, parece que a humanidade não vai aprender nunca. A sede de poder é muito maior do que a vontade de paz.
Grande abraço
Zé Correa