segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

SUIS-JE CHARLIE?




Como qualquer pessoa nascida e criada num país de tradições liberais e acalentada no seio de uma família de raízes multirraciais e inspirada pela tolerância, a ação terrorista contra o Charlie Hebdo repugnou-me. Detesto violência, especialmente quando ela é empunhada por mãos covardes e alimentada pela insensatez religiosa.

Horroriza-me o fato de que a Religião, um coletivo que engloba dezenas de fés cuja doutrina nuclear repousa nos pilares da paz e da compreensão, tenha sido, ao longo da História, o mais importante agente de guerras, perseguições, barbáries e atrocidades. Em nome de deus, seja ele qual for, foram desencadeadas hecatombes inimagináveis, visceralmente contrárias à pregação de fraternidade professada por todos os credos.

Dos sacrifícios a Baal, na Antiga Mesopotâmia, ao atentado de Paris na quarta-feira passada, leituras fundamentalistas dos códigos sagrados das diversas religiões serviram, e servem, de mandamento a extremistas dispostos a tudo para fazer valer a sua verdade teológica ou para vingar ataques aos seus profetas e santos.  Repetindo, rejeito, condeno e abomino o que os jihadistas argelinos perpetraram contra o jornal parisiense.

Mas, será que eu posso dizer EU SOU CHARLIE?

CHARGE RELIGIOSA DO CHARLIE
Para começar, sempre achei seu humor um pouco pesado, tipo pata de elefante. Embora reconheça os méritos e os traços de seus cartunistas, nunca achei muita graça nas charges publicadas, nem as políticas e nem as religiosas. Quando estive na França, em 1992, comprei um exemplar e verifiquei que não era o meu tipo de humor. Depois, não gostei das ridicularizações gratuitas, às vezes cruéis, que o Charlie disparava contra figuras que deveriam merecer um pouco mais de respeito. É claro que gosto da irreverência, de uma boutade perspicaz, da sátira fina e elegante, mas o canhão do Hebdo tinha um calibre grosso demais para meu paladar.




Nada disto, evidentemente, justifica o ato praticado pelos fanáticos argelinos. Para os que se julgam atingidos pelas charges, há sempre o recurso aos tribunais, ou até a um contra-ataque utilizando as mesmas armas dos ofensores, ou seja, o lápis, o papel e a inteligência. E foi um genial francês, François Marie Arouet, mais conhecido como Voltaire, que afirmou: “posso não concordar com uma palavra que você disser, mas defenderei até a morte o seu direito de dizê-las”.  A liberdade de expressão, este bem essencial à vida humana, precisa ser preservado, quanto mais não seja pelo dever que ela tem de ser responsável, verdadeira e capaz de assumir seus erros e exageros. Então, neste sentido, eu posso, sim, dizer:

EU SOU CHARLIE


Oswaldo Pereira
Janeiro 2015





5 comentários:

  1. Existe um tipo de narcisismo patológico capaz de desencadear a ira alheia. As provocações e o deboche do Hebdo estavam a meu ver, a espera da punição que os atingiu. E mais, virou marqueting. Vão vender muuuuito.

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  2. Caro Osvaldo, abomino esta violência, seja ela política ou religiosa, portanto JE SUIS MENGÕ. Abraço do Thomaz.

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  3. Renata está se coçando para dizer o mesmo mas fica com receio de que a interpretem mal...

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    1. Caro Homerix,
      Quem escreveu a saga de Hugo Escarlate não precisa ter medo de nada...

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  4. Desde a primeira hora, publiquei em minha página "Je suis Charlie". Concordo, nada justifica o atentado bárbaro contra a liberdade de expressão. Quem não concordar com a lei do país, que lute democraticamente para mudá-la. Ou vá cantar noutra freguesia.

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