Há
terras que contam sua história pelas pegadas das civilizações que as palmilharam. Geralmente, são campos férteis ou bacias hidrográficas, de clima
bom ou pelo menos adequado ao plantio e à criação de animais, cujos atrativos
propiciaram uma fixação contínua ao solo. Às vezes, o poder de retenção das
gentes ao lugar tinha a ver com a existência de metais preciosos, facilidade de
defesa, além de água e comida abundantes.
Com o
passar do tempo, os ativos naturais dessas regiões transformavam-nas em motivo
de cobiça de culturas supervenientes e, assim que um povo exauria sua força de
dominação, outro, mais forte, vinha ocupar seu lugar e, no processo de
ocupação, não raramente tratava de erradicar os traços deixados pelo que o precedera.
Mas,
felizmente, nem sempre conseguiam. Há civilizações tão poderosas, com
expressões culturais, principalmente religiosas, tão profundas, cujos templos e
cidades não puderam ser apagados com facilidade na poeira dos séculos.
E, se
há um lugar no mundo em que tantos e tão imponentes traços de três grandes
épocas sobrevivem em esplendor, esse lugar é o sul da Espanha, numa área que
cobre parte da Extremadura e da Andaluzia.
MÉRIDA
PONTE ROMANA |
Ao
final do século I a.C., o mundo romano experimenta um breve momento de calma. É
a Pax Augusta, uma clara confirmação
do mando de Roma, estendido desde o norte da Germania ao sul do Egito, do leste
da Judeia às praias do Atlântico. O Imperador decide então criar, às margens do
Guadiana, uma cidade para abrigar os soldados licenciados (os emeritus) de duas valorosas legiões, a V (Alaudae) e X (Gemina), cuja maestria bélica havia assegurado o controle sobre
as terras que vão do Sul do rio Douro ao Mediterrâneo – a Província Lusitana.
MERIDA NO SÉCULO I a.C. |
TEMPLO DE DIANA |
GRANADA
PAREDES DO ALHAMBRA |
Allahu-akbar! (Alá é grande). Escrita centenas de vezes nos volteios dos pórticos do Alhambra, esta invocação não deixa dúvidas. Os muçulmanos aqui plantaram o pujante germe de sua cultura, que sobrevive, seis séculos depois de sua expulsão do continente europeu, no lamento do flamenco, nos nomes começados com al, nos números arábicos e no tom de pele da paisagem humana de Andaluzia. Amorenado, isto é, da cor do mouro.
EXTENSÃO DA INVASÃO ISLÂMICA EM 730 |
Deu
certo. Em 732, pouco mais de vinte anos depois, os mouros já haviam chegado à
França, onde foram contidos na batalha de Tours por Charles Martel, e dominavam
quase toda a península ibérica. E o monte rochoso de onde tinham iniciado sua
invencível arrancada ganhara o nome de Djebel
al Tariq (montanha de Tariq), que transformou-se com o tempo em gib al tariq e finalmente em Gibraltar.
ALHAMBRA |
ALHAMBRA - ESTILO GRANADINO |
Em 1492, Granada cai ante os Reis Católicos Fernando e Isabel. É o último baluarte mouro. O Islã deixa o continente, mas sua alma sobrevive em Alhambra.
SEVILHA
Em
1248, Sevilha torna-se cristã. Pelos próximos quatrocentos anos, será o centro
do império espanhol, onde o sol nunca se punha.
CATEDRAL DE SEVILHA E GIRALDA |
Seus sucessores, entretanto, não mostrariam tanta benevolência para
com os infiéis e desencadeariam no século seguinte uma sangrenta perseguição
religiosa contra árabes e judeus, mandando para as fogueiras da Inquisição
todos os que não abjuravam de sua crença. Autos de fé passaram a ser espetáculos
frequentes nas praças da Juderia, onde
hoje as suas vielas intrincadas com nomes evocativos como calle de la vida e calle de
la muerte compõem o charmoso Barrio
de Santa Cruz.
BARRIO DE SANTA CRUZ |
No final do século XV, o mundo se abre
para a Espanha. Fernando e Isabel resolvem apostar no sonho de Colombo. O
genovês não chega às Índias, mas abre o caminho para as minas de ouro e prata
das Américas. Sevilha assume seu papel de ponto de partida e de chegada das
expedições que transferem um incalculável tesouro em metais preciosos. E é na Casa de Contratación que todo esse
tesouro passa, antes de ser distribuído pelo reino. E é também lá que são
armadas as frotas de naus que se lançam pelo Atlântico, à procura de mais
riquezas, como as esquadras de Fernão de Magalhães, de Cortez e de Pizarro.
São
recursos ilimitados, que permitem a construção de monumentos grandiosos, como a
espetacular Catedral, a maior igreja gótica do mundo, e a terceira em tamanho,
menor apenas do que São Pedro, no Vaticano e São Paulo, em Londres. É a arte
medieval cristã no auge de sua pujança, com inúmeras capelas cobertas de
relicário dourado e prateado, altares gigantescos trombeteando em seu silêncio
majestoso a glória da fé católica.
Três
credos, três culturas, três capítulos da História Universal. No sul da Espanha.
Oswaldo
Pereira
Fevereiro
2014
Grande Ozzy! Apenas uma observação: Não vamos esquecer da "nossa" Basílica de N.S. Aparecida, que é hoje a segunda maior do mundo, atrás apenas da de São Pedro, naturalmente, graças ao próprio Vaticano q proibe templos maiores. A de Sevilha desceu da segunda para a terceira posição, o que não tira sua imponência, beleza e importância. Quem não consta nessa lista das super "monstros" templárias é a de São Paulo em Londres. Grande Abraço e Parabéns pelo post.
ResponderExcluirP.S. ..que viagem!! :-)