sábado, 28 de março de 2020

O RIO DE JANEIRO DO MEU TEMPO




De repente, eu notei. Alguma coisa havia mudado. Já estava acordado há algum tempo. Da minha janela para o nascente, a manhã também acordava. Mas, como eu, estava diferente. Uma certa leveza, uma certa paz.

De repente, eu me lembrei.

Quando eu era pequeno, meus pais compraram uma obra alentada, de três volumes encadernados em negro com letras douradas. Liam-na com fervor e brilho nos olhos. A trilogia atendia pelo nome de “O Rio de Janeiro do Meu Tempo”, do escritor carioca Luiz Edmundo e, escrita no final da década de 1930, reunia um conjunto de crônicas sobre a Cidade, sua vida e seus costumes na década anterior.

Pois o Rio de Janeiro do Meu Tempo tinha céus imaculadamente azuis, poentes delicados e majestosos, brisas que inspiravam Johnny Alf, sol a queimar que revirava a paleta musical na valsa de Antonio Maria, das flores que voltavam ao compasso de Paulo Soledade.

Eles estão todos de volta. E, ironicamente, despertados de um longo sono pela dramática diminuição do movimento imposta pelo medo e pelo poder público. Carros saíram das ruas. Menos CO², menos motores cuspindo fumaça e ronronando pelas esquinas, menos gritos de buzinas ansiosas.

Isto bastou. O céu acertou o azul de um outono criança. O vento modulou seu sopro na cadência precisa. O silêncio jogou seu manto delicado sobre as ruas desertas. E, de repente, o Rio voltou a ser o do meu Tempo...

Oswaldo Pereira
Março 2020

6 comentários:

  1. estou me sentindo tb num lugar único !
    atenção plena e total alheamento.

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  2. Que lindo, Oswaldo!! Hoje vi 3 borboletas e o dobro de maritacas que vem nos acordar bem cedo! Beijos carinhosos pra vcs dois!

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    1. Brigadíssimo, querida maestrina. E o Rio de Janeiro continua lindo...

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  3. olá Oswaldo
    Realmente a paisagem e o movimento nas ruas no Rio diminuiu muito ao ponto de não sentir o barulho e a polução dos ônibus e caminhões.
    É o outro lado da moeda que nos faz ver a cautela e a obediência as recomendações do governo.
    Espero que a sociedade mude e aprenda uma lição com tudo isto.
    Abraços
    Emilio Telleria

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    1. Caro Emílio, quando sairmos desta, veremos um Rio (e um mundo) diferente...

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