quinta-feira, 17 de setembro de 2015

A RAINHA







O rei do Egito Faruk I disse, quando foi destronado por um movimento militar liderado por Gamal Abdel Nasser em 1952, que, no futuro, só existiriam cinco reis no mundo – o da Inglaterra e os quatro do baralho.

Não acertou de todo. Ainda há várias casas monárquicas em plena atividade na Europa, na Ásia e na África. Talvez o futuro a que ele se referia ainda não chegou... Mas, pelo menos quanto à durabilidade do trono britânico, ele não poderia estar mais certo.

Elizabeth II acabou de bater o recorde de permanência real da história da Grã-Bretanha. No passado dia 9, ela completou 63 anos e 217 dias de reinado, superando a marca de sua trisavó, Vitória.

ELIZABETH CRIANÇA
Elizabeth Alexandra Mary Windsor não nasceu para ser rainha. Suas chances na linha de sucessão eram pequenas pois seu pai, o príncipe Albert Frederick, era o segundo filho de George V. O primogênito, Edward, fora criado com todos os pressupostos para assumir o cetro real. Além disso, havia sido generosamente aquinhoado pela natureza com uma personalidade cativante, à qual uma requintada formação trouxera os maneirismos sofisticados da nobreza.  Em acentuado contraste, o irmão mais novo era tímido e introspectivo. E gago.

Tudo mudou em dezembro de 1936, quando Edward, já ungido pela coroa em janeiro do mesmo ano, resolveu abdicar, nos dizeres de seu próprio discurso de renúncia, “for the woman I love” (“pela mulher que eu amo”). Essa mulher chamava-se Wallis Simpson, uma socialite com “defeitos” gravíssimos para o estômago da corte inglesa. Era americana e duas vezes divorciada.

Um parêntese. Além de mudar o futuro da jovem Elizabeth, a abdicação de Edward VIII mudou também o futuro do mundo. Já no início da década de 1930, era notória a admiração de Edward pela transformação que Adolf Hitler operava na Alemanha. Se tivesse continuado no trono, seria bem provável que o posicionamento do Reino Unido com relação ao Terceiro Reich fosse de conciliação e não de antagonismo. Dificilmente, ele convidaria Winston Churchill, um visceral anti-nazista, para o cargo de Primeiro-ministro, preferindo as atitudes mais conciliatórias de Halifax, ou mesmo de Chamberlain. Mas o se é apenas uma esquina do tempo que não foi virada...

Assim e de repente, Albert Frederick foi relutantemente catapultado para o lugar de Rei, com o nome de George VI, e Elizabeth para a linha de frente da sucessão. E, nos anos da Guerra, ela começou a esmerar sua formação para o cargo que agora já lhe aparecia no horizonte e a trabalhar com zelo a imagem que iria projetar para seu povo. Em 1952, no mesmo ano em que o rei Faruk disse sua famosa frase, George VI morreu e Elizabeth foi coroada.

ELIZABETH EM UNIFORME: TÉRMINO DA SEGUNDA GUERRA


COROAÇÃO DE ELIZABETH II
A segunda metade do século XX pode bem passar à História como um dos mais modificadores períodos da humanidade. Uma reviravolta alucinante nos conceitos morais, sociais e políticos, alimentada por galopantes avanços tecnológicos em todas as áreas do saber, mudou radicalmente comportamentos, crenças e expectativas. A década e meia do século XXI já nos avisou que o ritmo vai acelerar ainda mais. Adaptação é a palavra-chave.

"TROOPING THE COLOUR". ANIVERSÁRIO DA RAINHA
E é isto que a Rainha Elizabeth II tem feito com suprema eficiência. Só para citar alguns dos acontecimentos que mexeram com o United Kingdom, nestes últimos 63 anos tivemos a guerra do Canal de Suez em 1956, a saída da África do Sul em 1959 da Comunidade Britânica e o começo da desintegração política do Império, o IRA e seus conflitos na Irlanda do Norte, a introdução do sistema decimal em 1971, a guerra das Malvinas em 1982, a queda do muro de Berlim e a reunificação alemã em 1989, a guerra do Golfo em 1991, a criação do Parlamento Europeu em 1993, o divórcio do príncipe Charles em 1996, a morte da princesa Diana em 1997, o onze de setembro, plebiscitos na Escócia e em Gales e a crise econômica de 2008. Tivemos Beatles, James Bond, bebês de proveta, mais divórcios reais, escândalos familiares estampados numa imprensa marrom e impertinente. De Churchill a Cameron foram 12 Primeiros-ministros, enquanto Trabalhistas e Conservadores alternaram-se no comando do Parlamento.

A julgar pela segurança com que se desincumbe de sua agenda e pela simpatia e o respeito que cada vez mais inspira em seus súditos, ela é forte candidata a suplantar outros reis longevos, como o tailandês Bhumipol Adulyadej (69 anos de reinado) e o francês Luís XIV (72 anos) e assegurar a continuidade de uma monarquia nascida no ano de 871 com Alfred the Great.


God Save the Queen

Oswaldo Pereira
Setembro 2015



6 comentários:

  1. Tão austera e tão fofa. Gostaria de ouvi-la, de repente me dei conta de que nunca ouvi o pronunciamento de um monarca. É isso mesmo? Os Reis não falam???

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    1. A Rainha lê. Seus discursos são preparados por uma equipe de "speechwriters" composta de assessores políticos, econômicos, etc. Nunca de improviso, como alguns governantes que conhecemos...

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  2. Tenho grande admiraçao pela Inglaterra, pela Rainha e pelo povo. País pequeno e vive com independencia e dignidade. E isso no mundo que hoje é só escândalo, roubo e desorganização.

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    1. Como dizem, "de perto ninguem é normal". A Inglaterra tem vários esqueletos no armário. Mas, pelo menos, tem organização e, sobretudo, adora as tradições.

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  3. Acho q tb estou de luto.

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  4. Acho q tb estou de luto

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