Não aguardo, não antecipo, não espero. Não quero o amanhã como
bandeira. Não vivo o futuro. Nem que eu queira sucumbir à esperança, o quando
aqui não está. O porvir não é, apenas será. Mas só quando vier, quando estiver
aqui ao meu lado. Agora, nem sombra dele, nem um fio, pavio de vela. Ainda por
acender. E este hoje logo será um ontem. Será tempo inerte, seguro, dócil, sem
surpresas. Passamos os dias a colecionar ontens, a catalogá-los em prateleiras
virtuais, passatempo cruel que nos empurra. Sem querermos.
Eu não quero muito. Eu quero mais.
Quero encilhar o Tempo, quero senti-lo corcel dominado das minhas
vontades, meu escravo. Quero prendê-lo em cadeias, em correias, em peias. Quero tê-lo ali,
algemado, refém de um gesto, um aceno meu para mover-se. Quero sustar a
carruagem de fogo que cruza os céus, a sombra que avança num relógio solar, a
maré dos segundos, o vendaval dos minutos, o passo das horas. Quero sustar
equinócios e solstícios, rotações e precessões. Quero quebrar ampulhetas,
enganar calendários, vigarizar folhinhas.
Eu não quero inventar a máquina do Tempo. Não vou cheirar o pó de
pirlimpimpim, atravessar o portal das eras, entrar no Expresso 2222, nem para
antes, nem para depois. Meu sonho é o Já, imutável, amovível, espraiado
lânguido como uma paisagem de Turner, sem pressas, repetindo-se ad nauseam como o Bolero de Ravel. Meu céu é o Agora, minha sina o Momento, meu
deus o Presente.
Oswaldo Pereira
Março 2014
Ah, miserere mei, que às vezes o Agora é o meu inferno, o Momento me assassina e o Presente é o diabo que me carregue. Mas só às vezes, não agora, que o Bolero de Ravel insiste ad deliciam... ou ad delictum?
ResponderExcluir.
Vai enxugando que um dia vira poesia.
ResponderExcluirAdoro o Bolero de Ravel !!!
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