quarta-feira, 12 de setembro de 2018

O ATENTADO



Atentados políticos não são raros. A partir da Antiguidade Clássica, assassinatos, ou tentativas de, permearam a evolução de várias sociedades, alguns decisivos na mudança do curso de sua História, outros trazendo até consequências planetárias. Desde quando os senadores romanos abateram Júlio César, a polarização política tem sido a grande inspiradora de atos extremados, cujo objetivo é fazer calar uma voz, extirpar um pensamento ou eliminar uma filosofia pela força, quando o desespero da falta de argumentos ou de sensatez obscurece a razão.

Independentemente, entretanto, de qualquer motivação, o atentado, além de ser um crime, é uma forma truculenta e primária de se expressar uma fé partidária ou um compromisso religioso. É o ponto mais baixo do comportamento humano diante de uma ideia contrária, é a falência da capacidade intelectual de se reagir a ou de contrapor com inteligência uma proposta contrária ou um posicionamento adversário.

Mais do que isto, o atentado, venha de onde vier, se reveste de características inaceitáveis como procedimento social.

Em primeiro lugar, é uma ação covarde. O agente do atentado vale-se sempre da surpresa, apanhando sua vítima indefesa, geralmente desarmada, negando-lhe qualquer possibilidade de reação.

Em segundo lugar, é uma ação estúpida. Na maioria dos casos, o atentado provoca um efeito exatamente contrário ao pretendido pelo atacante, mesmo quando tem como consequência a morte do atacado, cujas ideias recebem a galvanização de seu martírio. Se o alvo sobrevive, sua força multiplica-se pelo seu salvamento.

E, por mais que queiram revestir o ato como ação de um lobo solitário, um atentado é, na grande maioria das vezes, a parte final de um planejamento. Assim foi com Júlio César, vitima de um conluio de patrícios, com o Arquiduque Ferdinando, abatido pela Crna Ruka, a Mão Negra sérvia. John Wilkes Booth fazia parte de um grupo que desejava a continuação da Guerra da Secessão quando alvejou Lincoln. Até hoje, existem fortes suspeitas sobre o assassinato dos Kennedys e de Martin Luther King. Há, quase sempre, uma voz atrás da cortina guiando a mão que empunha a arma.

Assim, eu acho que ainda há muita história para contar sobre Adélio Bispo de Oliveira, o quase assassino de Bolsonaro...


Oswaldo Pereira
Setembro 2018

quinta-feira, 6 de setembro de 2018

TRISTEZA PROFUNDA

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Acho que já vivi o bastante para perceber que nenhuma sociedade poderá progredir sem Educação. Não conheço povo algum que tenha crescido e se desenvolvido, ou até sobrevivido, sem nela investir pesadamente, gerações a fio, privilegiando-a acima de qualquer outra atividade ou interesse. Para exercer a pleno a Democracia, por exemplo, necessário é que ela exista para proporcionar escolhas sensatas, garantir vigilância atenta e infundir o respeito à coisa pública.

Também não encontro país que tenha atingido um razoável patamar de Nacionalidade sem preservar com amor reverencial sua Cultura, e sem cultuar a sua História. Sem passado não há futuro. É uma frase gasta, eu sei, mas nem por isso menos verdadeira.

Assim, como qualquer brasileiro, ou mesmo qualquer pessoa com um mínimo de sensibilidade cultural, estou profundamente triste com a destruição do Museu Nacional da Quinta da Boavista.

Mas, a profundidade da minha tristeza é maior porque sei que estamos, mais uma enésima vez, diante de um ciclo. O que está acontecendo agora, Brasil afora, é novamente a repetição do que acontece toda vez que o país é golpeado por uma tragédia.

Primeiro choramos, nos espantamos e enraivecemo-nos. Depois, vamos procurar os culpados, e somos capazes de encontrá-los em todo lado. No caso do Museu, balões, falta d’água nos hidrantes, administradores relapsos, prefeituras e governos incompetentes, inspeções malfeitas ou relegadas, falta ou atraso de verbas. Muitos ou talvez todos têm culpa no cartório. Puníveis, portanto.

Aí, entretanto, vem a continuação do ciclo. O Tempo. Aos poucos, o assunto se esvai para o andar de baixo das notícias. Apesar dos anátemas furiosos, ninguém vai ser punido. Os belos discursos que prometem reconstruções e aportes generosos cairão na indiferença e as verbas prometidas serão desviadas.

E a vida vai continuar, até a próxima tragédia e um novo ciclo de comiseração provisória se iniciará. A medida curta da nossa memória se encarregará de nos condenar à sina pobre de um povo sem Cultura. E sem Educação.

Oswaldo Pereira
Setembro 2018  

segunda-feira, 3 de setembro de 2018

NOVO JOGO SUCESSÓRIO





Lula OUT.

Como dizia Drummond, e agora, José?
O que acontece, agora, com esta dramática mudança no quadro sucessório? Não sou nenhum analista político, mas dá para perceber algumas coisas.

A primeira é que a candidatura Bolsonaro sofreu um rude golpe. Visto como um contraponto às pretensões do PT, Jair Bolsonaro era o receptor natural dos votos anti-Lula, na polarização esquerda versus direita em que se tornara a campanha eleitoral. Com o Partido dos Trabalhadores sem um candidato viável (a transferência do lulismo para Haddad é impossível), a alternativa Bolsonaro fica meio que esvaziada, e os olhos de muitos de seus apoiadores desviados para outras possibilidades.

E aí surgem mais três atores que antes estavam ofuscados pelo duelo Lula-Bolsonaro.

Geraldo Alkmin é seguramente o mais beneficiado. Mesmo identificado com o status quo político e descartado por seu propalado “carisma” de picolé de chuchu, ascende a pré-protagonista dada a sua experiência administrativa como Governador de São Paulo por dois consecutivos mandatos e um discurso, se não empolgante, pelo menos coerente.

Álvaro Dias segue na mesma esteira, tendo como cartão de visita suas décadas de parlamentar ponderado e um certo apoio do Centrão. É claro que é um nome palaciano e está longe de ter a difusão nacional necessária para carrear milhões de votos, mas pode entrar no vácuo deixado pelo encolhimento eleitoral do PT.

E o inesperado João Amoêdo. O fundador do Partido NOVO é mesmo uma novidade. Divulgando-se como empresário apolítico e independente através de uma muito bem engendrada campanha na Internet, seu nome saiu de um anonimato profundo para os percentuais do Ibope em pouquíssimo tempo. Os outros candidatos, ao recusarem sua participação nos debates televisivos, também lhe fizeram um imenso favor, ungindo-o com uma aura de outsider do entranhado mundo dos conchavos eleitorais.

Isto tudo para dizer que, na minha modesta visão, a partida sucessória não vai acabar no Primeiro Turno. O jogo vai ter prorrogação, num embate entre Bolsonaro e um dos três acima.  Quer dizer, vamos viver em suspenso até novembro...

Em Tempo:
A destruição do Museu Nacional da Quinta da Boavista por um incêndio, depois de décadas de descaso e abandono, é uma das mais cruéis punhaladas no coração da cultura brasileira. Peças de valor inestimável, perseverantemente colecionadas durante o Império, viraram cinzas. Perdidas para sempre. Mesmo os mais insensíveis habitantes deste planeta descartável em que vivemos devem parar um pouco e verter uma lágrima. O Brasil e o Mundo ficaram mais pobres neste fim de semana.

Oswaldo Pereira
Setembro 2018


quinta-feira, 23 de agosto de 2018

MOMENTO CRUCIAL



Quanto mais eu penso, daqui de longe, embalado pelas brisas do Tejo, mais eu me convenço de que as próximas eleições brasileiras representam um momento crucial na história do país. Parece retórica ou um dos muitos chavões que abundam na literatura política e na dramaturgia barata. Mas, permitam-me defender este meu professado convencimento.

O Brasil está prestes a completar 200 anos de independência. Nasceu, portanto, pouco depois do apogeu napoleônico e na hora em que ventos libertários sopravam com muita força no continente americano, um vendaval de ideias contra o qual os dois gigantes das descobertas, Portugal e Espanha, e a própria Inglaterra, não mais dispunham de forças para dominar.

Foi um rastilho de pólvora que rendilhou todo o Novo Mundo num festival de novas fronteiras, ditadas principalmente por demarcações comerciais desenhadas nos séculos XVI e XVII. E pela língua. Preservado pelo idioma português, ao Brasil coube um território de dimensões quase incompreensíveis para a época. Incompreensível e ingovernável.

A precariedade das comunicações, o imenso custo para se estabelecerem ligações entre a Corte e o resto do país, a inexistência de caminhos terrestres viáveis foram definindo as limitações da atuação do Governo Central. Do começo do Império até quase o final da Primeira República, o Poder era estritamente palaciano e apenas a extensa faixa costeira, os vales mineiros e o planalto paulista abrigavam a quase totalidade das atividades produtivas e comerciais. E políticas.

Brasília pode ter sido o toque de chamamento para a descoberta do Brasil interior. Mas foram os avanços no transporte, nas novas técnicas da agroindústria e na rapidez dos meios de comunicação que acordaram a miragem das riquezas de um país ainda desconhecido.

Mas, o mal causado por século e meio de loteamento político, usado e abusado pela Monarquia e pelos sucessivos Governos Republicanos, encastelados na Corte e suportados pelas fortunas que haviam ajudado a crescer, estava feito. A marcha para o interior e seu desbravamento foram tutelados pela política clientelista, aquela de favores e jeitinhos, multiplicadora de impostos e propinas. Em pouco tempo, esta cobra insidiosa, agarrada como uma liana na árvore do crescimento brasileiro, já havia parido o seu monstro. A Corrupção.

Com uma eficiência digna de arrepios, o Monstro cresceu e multiplicou-se. E hoje, lustroso e cevado, domina o sistema político-administrativo em todos os níveis da vida pública nacional. E não se esqueçam, amigos. Todo este processo foi feito debaixo dos nossos olhos, à nossa vista, se não com o nosso inteiro beneplácito, pelo menos com a nossa preguiçosa indiferença.

Desta vez, não há mais desculpas. Graças à extensa divulgação pela mídia, à inequívoca conscientização do povo brasileiro e, em não menor medida, às arenas das redes sociais, todos temos a obrigação de saber que o país não vai aguentar muito mais tempo neste ritmo e nesta dança. É o Point of No Return.

Um erro de escolha agora pode ser fatal.


Oswaldo Pereira
Agosto 2018

segunda-feira, 30 de julho de 2018

DONALD & VLADIMIR





Agora que a bola parou, a Europa acorda para um verão com turistas demais, incêndios cruéis e uma pequena ressaca causada pelo abrandamento das previsões de crescimento para 2019. 
Mas, o assunto do dia é Donald Trump.

A cimeira de Helsinque tocou nos nervos do Mercado Comum. Enquanto nos Estados Unidos a imprensa democrata (e alguma republicana também) fala da subserviência do Presidente americano ao Czar Putin, e toda a aparelhagem da teoria da conspiração municia as redes sociais com tenebrosos porquês de tal submissão, os europeus tentam ler a mensagem real da situação.

E descobrem que o “America First” do discurso inaugural não era só retórica. Trump está disposto a reverter anos de mão única nas relações comerciais entre os dois continentes, durante os quais os Estados Unidos mais que generosamente suportaram um certo protecionismo das democracias ocidentais europeias. O irmão grande yankee, desde os tempos da Guerra Fria e preocupado com perigo soviético, custeou a maior parte da fatura da NATO, prodigalizou acordos tarifários extremamente favoráveis à Europa e acarinhou o clube europeu importando seus carros, bebendo seus vinhos e gastando tsunamis de dólares na Côte d’Azur e adjacências.

Agora, tudo é diferente. O inimigo de ontem virou capitalista e quer participar da grande mesa do mercado internacional. À Rússia de Vladimir interessa o mesmo que à América de Donald. Comer pelas bordas o prestígio e a importância do Mercado Comum, desestabilizando-o, endurecendo o jogo comercial e, se possível, tentando desintegrá-lo. O Reino Unido já fez o seu primeiro grande favor com o Brexit. E as eleições recentes na Itália, onde uma coalizão impensável há seis meses chegou ao poder, atiraram mais lenha na fogueira. Alguém ainda duvida da eficácia de um ataque cibernético para influenciar votações? Cada vez há mais indícios disto nos Estados Unidos. O que dizer de Áustria, Holanda, Polônia...

Mas, o que vem unindo Donald e Vladimir não é uma quizília contra o Velho Mundo. E tampouco devem ser os roteiros que implicam Trump em negociatas com máfias russas ou escapadas com louras moscovitas. O que os une é o temor. Temor a um fator que pode (e irá) baralhar tudo o que conhecemos de relações internacionais. A China.

Num dos meus primeiros textos neste blog, escrito há quase cinco anos, eu dizia que qualquer previsão para os próximos dez anos, para qualquer atividade comercial, militar, artística ou desportiva, tinha de incluir o fator China como determinante. Há pouco mais de um ano, os chineses consolidaram um poder incomensurável nas mãos do presidente Xi Jinping. Isto quer dizer que o país tem uma liderança forte, que poderá conduzi-lo a assumir seu papel como a maior potência do planeta até meados deste século.

Oswaldo Pereira
Julho 2018


quarta-feira, 20 de junho de 2018

CR7




Começou a grande festa.

Neste mundo atribulado, a Copa da Rússia serve como uma pequena catarse, um doce oásis em que as emoções escapam atrás de uma bola, trazendo disputas, diferenças e desavenças para as quatro linhas de um campo de futebol. É claro que a vida segue à margem dos estádios, mas pelo menos, durante alguns momentos, o mais importante é o grito de GOL.

Como estou em Portugal, não podia deixar de sentir a proximidade da trajetória da seleção “das quinas”, que é como os da terra carinhosamente chamam o seu time, e da figura de seu expoente maior. Cristiano Ronaldo aqui é deus.

E, até onde eu posso enxergar com a minha percepção de seguidor assíduo desse esporte por quase sete décadas, ele o faz por merecer. Num permanente esforço de superação, CR7 tem feito o que o planeta exige dele. Tem matado um leão por dia.

Teoricamente, esta seria sua última copa. Mas, nada é certo. Recentemente, exames constaram que Cristiano Ronaldo, embora tenha já 33 anos, detém a forma física de 25. E isto não é nenhuma surpresa. Desde o início da carreira, ele obedece a uma auto imposta disciplina de treinos e dedicação. Sempre foi o primeiro nos ginásios e o último a sair. Não fuma e, por ter perdido o pai cedo, vítima de alcoolismo, não bebe uma gota. Por ser doador regular de sangue, talvez seja o único jogador de fama que não ostenta uma tatuagem sequer.

Como pessoa, tem-se desdobrado em ajudar financeiramente várias organizações dedicadas à infância e são inúmeras as ocasiões em que aparece ajudando crianças carentes ou com doenças graves. Há dois dias, após o jogo contra a Espanha, desceu do ônibus que levava a delegação portuguesa para o hotel e confortou um garoto que chorava, dando-lhe uma recordação para toda a vida.

Por qualquer parâmetro que se examine, é um jogador decisivo. Basta rever os inúmeros lances de seus jogos, desde os tempos do Manchester United. Na história do futebol português, desde Eusébio não aparece ninguém como ele. Na partida de sexta-feira passada contra os espanhóis, repetiu a dose e seu gesto de “eu estou aqui”. Está, sempre.

Só para comparar, Cristiano Ronaldo converteu o pênalti que sofreu, chutou a bola que queimou a mão do De Gea e bateu com extrema competência a falta. Três gols. O Messi não fez nada disso. Nem o Neymar...

Oswaldo Pereira
Junho 2018

quinta-feira, 7 de junho de 2018

AGRURAS DE UM BLOGUEIRO


Estou no lado Primavera do mundo. E aqui estive desde o início do mês passado, mudo e quedo diante de um planeta que, de uns tempos para cá, tem inventado coisas que me deixam sem palavras.

No entanto, as palavras, essas, vêm aos borbotões, extravasando pelas bordas das redes sociais, sem peias nem censuras, espalhando-se como formigas de uma imensa colônia, levando as notícias já interpretadas, comentadas e, como não podia deixar de ser, distorcidas pelo humor pessoal de quem as dispersa pelo universo.

Hoje, sabemos o que se passa ao minuto. Os smartphones nos acordam a cada momento com seus pings apressados, revelando desde a interrupção de um cotidiano do outro lado desta bola azul a que chamamos Terra até a mais recente receita de pãozinho de leite da tia Joana. Tudo é notícia.

Como escrever num mundo assim? Que assunto posso eu cogitar cujo interesse consiga arrebatar a atenção de um leitor atormentado pela enxurrada constante de sms’s, bate-papos no WhatsApp, recadinhos no Twitter e em outros salões virtuais de comunicação, cujos nomes me escapam e me deixam inquieto.

Que futuro temos nós articulistas, blogueiros, colunistas, num cipoal de informações ao segundo, velozes e invasivas? Chegaremos sempre depois da notícia, oferecendo frases de segunda mão, pratos já frios, tardios e irrelevantes, montados em asnos enquanto todos já partiram em suas naves espaciais.

Não podemos mais competir. O que falaremos ou escreveremos irá para um arquivo morto. Soará como uma cantiga envelhecida e avoenga, cuja música quase inaudível se perderá no torvelinho vibrante dos cliques e da movimentação frenética dos polegares em cima de teclados iluminados.

O tempora! O mores!, diria Cícero se cá estivesse. Aliás, talvez nada dissesse e sim mandasse célere uma mensagem digital aos senadores, com uma selfie sorridente...

Oswaldo Pereira
Junho 2018