O
passado, para quem tem mais de 80 anos, é enorme. À medida que o futuro mingua,
os anos se acumulam para trás, com todas as lembranças que, com sorte,
conseguimos reter. E nos praz acariciar, no tempo que parece infindável neste
dia-a-dia que escorre lânguido (já diziam que, na velhice, os dias passam
devagar e os anos voando...), algumas memórias, estórias e momentos vividos.
Às vezes, alguns acontecimentos servem para reaviva-los, retira-los dos baús em que dormem nos sótãos de nossos neurônios, e espana-los. Quando isto acontece, o brilho original de alguma imagem ou de alguma sensação, há muito coberta pela poeira do abandono, renasce colorido e vibrante, quase novinho em folha.
Foi o que ocorreu há dias comigo. Como muitos de vocês já sabem, sou um inveterado leitor. Tenho sempre um livro a ler e, nos raros períodos de entressafra literária, sinto as melancolias da privação, como qualquer viciado afastado de seu vício. Pedindo perdão pela “americanada”, considero-me um juramentado bookaddict.
Assim, nunca passo por uma livraria impunemente. Um poderoso magneto me empurra para dentro, e ali sou capaz de passar largos momentos, a olhar as capas, a manusear as páginas, a sorver com volúpia as promessas dos textos e de suas revelações. E foi numa dessas que me deparei com um livro de Arsène Lupin.
Para os menores de 70 anos, talvez a única referência trazida pelo nome seja a série Lupin, lançada pela Netflix no ano passado. Mas, para os maiores...
Arsène Lupin foi uma criação do escritor francês Maurice Leblanc. Sua primeira aventura (A Detenção de Arsène Lupin) foi publicada na forma conto pela revista Je Sais Tout (o correspondente almanaque brasileiro Eu Sei Tudo foi um ícone de sua época), em julho de 1905. Daí até sua morte em 1941, Leblanc escreveria 18 romances, 39 novelas e 5 peças de teatro sobre o seu personagem.
A coleção dos livros de Maurice Leblanc foi devorada pelos adolescentes do meu tempo. Lupin era o arquétipo do gentleman cabrioleur, o ladrão cavalheiro, e sua insuperável capacidade para disfarces, sua superior inteligência e sagacidade e sua aptidão para resolver enigmas, praticar roubos espetaculares e fazer os delegados da Sûreté, a polícia francesa, de idiotas nos traziam em aguçado deleite.
Em tempo: dizem que Leblanc criou Lupin para espicaçar os ingleses, dentro da velha rivalidade gálico-saxã, que tinham como herói Sherlock Holmes. Um de seus livros, inclusive, trata de um confronto direto entre o ladrão francês e o detetive britânico. O título, dada reação irada de Sir Arthur Conan Doyle ao ver o nome de sua criação usado pelo rival, foi mudado por Leblanc para “Arsène Lupin contra Herlock Sholmes”...
O livro com que me deparei, e que me abriu um portal para o passado, foi La Barre-y-Va, um dos últimos escritos por Maurice Leblanc. Lê-lo foi como voltar a passear pelos caminhos em que trilhei, deslumbrado e aventureiro, os meus anos da adolescência.
Oswaldo Pereira
Novembro
2021
tambm adorava os livros do arsene Lupin e agora stou vendo com interesse a serie do netflix, gostei do pesonagem, um negro frances que faz a policia de idiotas totais
ResponderExcluirGostei muito da série. Tomara que continuem.
ExcluirPara quem gosta do estilo, os ingleses são os meus favoritos, desde Sherlock
ResponderExcluira Agatha Christie. Achei ótima a troca do nome pelo Leblanc, mas mesmo assim está na cara.bjs Zezé
Os estilos (de Leblanc e de Doyle) são completamente diferentes. E espelham bem a dualidade entre ingleses e franceses, uma história de rivalidade que vem da Guerra dos 100 Anos...
Excluir