terça-feira, 6 de agosto de 2019

DESTINOS CERTOS: MADRI



No século IX, auge da idade de ouro islâmica, a região fazia parte do Al-Andaluz. Sua planície e o rio que a cruzava pertenciam ao emirado de Córdova, governado por Muhammad (ou Maomé) I. Maomé tinha bom gosto, cultura e dezenas de excelentes arquitetos à sua disposição. Nas margens desse rio, cujo nome era Fonte de Água, ordenou a construção de um palácio para seu deleite e seu harém. Fonte de Água em árabe escreve-se al-Majrit. Quando, 700 anos depois, o rei de León, Afonso VI, a conquistou durante sua avançada para Toledo, a pequena vila que crescera ao redor do palácio já havia transformado o nome al-Majrit. Ela agora se chamava Madrid.

Hoje, ela está no centro geográfico, político, econômico e cultural da Espanha. Em 2010, a prestigiada revista Monocle a qualificou como a décima cidade mais habitável do planeta. Dez milhões de turistas a visitam todos os anos. Para quem está passando uma temporada em Portugal, ela está aqui ao lado. Menos de uma hora de voo, e você está no Aeroporto de Barajas. E a aventura começa.

Minha aventura inicial teve um sabor amargo. Logo na primeira viagem de metrô, um ardiloso (ou ardilosa) punguista surrupiou-me a carteira e lá se foram documentos e cartões bancários. Minha manhã de abertura em tierras madrileñas foi um rosário de ligações às agências bancárias e um périplo apressado entre a delegacia de polícia e o Consulado, para obter uma documentação que me permitisse pegar o avião de volta.

Mas aí, de repente, a tarde abriu-se num delicioso sol de verão e, aos poucos, o amargo do início foi sendo substituído pelo sabor de um delicioso prato de presuntos de diversas categorias no Museo del Jamón. Daí para a frente, Madri venceu.

A primeira palavra que os sentidos escolhem é imperial. A cidade foi feita para ser a capital de um império, cujo limite era a metade de um mundo que os espanhóis dividiam com os portugueses. Sua arquitetura, desenhada ao longo de grandes avenidas, parece falar disto em todas as rebuscadas fachadas barroco-clássicas, em seus parques, nas suas fontes e em suas praças.

Onde, no século XVI, os não-crentes ardiam nos autos-de-fé da Inquisição, você hoje, mesmo crendo apenas nos desígnios do destino, pode caminhar num enorme quadrilátero cercado de prédios palacianos e arcadas elegantes, repletas de lojinhas charmosas e restaurantes ao ar livre. É a Plaza Mayor.

PLAZA MAYOR

 Dê alguns passos preguiçosos e encontre outra imperdível experiência, esta deliciosamente gustativa. O Mercado de San Miguel, reino das tapas e das cavas, lugar de eleição dos naturais e dos turistas no pré-poente dourado de uma sexta-feira. Cheire, olhe, prove, beberique. E saia tão leve que a centena de metros para chegar à Puerta del Sol vão parecer um ligeiro flutuar.
PUERTA DEL SOL

Lá chegando, tire logo um selfie de seu pé em cima do Km 0, e saiba que você está bem no centro de Madri e da Espanha, de onde partem e aonde chegam todos os caminhos. Só então olhe a Praça, que vive em permanente adoração ao Sol que lhe dá nome. Coloridas tribos de artistas de rua, estátuas vivas, dançarinos, acrobatas e músicos de toda sorte cutucam o hippie que você deve ter no fundo da alma. Cantarole mentalmente Let the Sun Shine In e faça uma reverência.

Parar para descansar? Nem em pensamento. Mergulhe no caudaloso rio de gente que flui nas largas avenidas radiais que saem da Praça, como a Calle del Arenal ou a Calle de Alcalà. Deixe-se levar pela correnteza e você aportará na Fonte de Cibeles e no início da Gran Vía. Faça uma prece ao deus dos caminhantes e palmilhe essa broadway latina até chegar à Plaza de España. E então, só então, escolha uma esplanada, dê um merecido repouso às pernas e regale o estômago vazio com os petiscos da terra.

GRAN VÍA
No dia seguinte, se bem lhe aprouver, alimente o espírito. Juntinhos, ao redor do Paseo del Prado, estão três dos mais importantes museus de arte da cidade. O Thyssen, o Reina Sofia e o maior e mais famoso deles todos. O Museo del Prado.

Como qualquer dos mais comuns mortais, você já deve ter visto fotografias e reproduções do Las Niñas de Velásquez, dos autorretratos de Rembrandt, das Majas de Goya, d’O Jardim das Delícias de Bosch, do Autorretrato de Dürer, d’O Batismo de Cristo de El Grieco. Pois todas elas, junto com centenas de outras, estão a um palmo do seu nariz no Prado. São horas de puro êxtase.

'LAS NIÑAS" DE VELÁSQUEZ











Se a viagem for curta como a minha, arranje ainda um tempo para ir à Catedral de la Almudena, a imensa igreja sede de Madri. E, impreterivelmente, ao Palácio Real. Construído no mesmo sítio onde Maomé I erguera o seu no século IX e dera origem à cidade, o edifício reafirma o caráter monumental da capital espanhola. Tudo é grande, majestoso, imperial.

PALÁCIO REAL DE MADRI
Por fim, coma uns churros con chocolate no San Ginés e ande. Ande sempre. Há vielas, esquinas, feiras populares, como a de El Rastro, cantinhos, portas, janelas, cheiros sons e cores esperando por você. E depois, volte para casa com a sensação que ainda há muito, muito para ver neste destino certo que é Madri.

Oswaldo Pereira
Agosto 2019

Um comentário:

  1. Olá Oswaldo.
    Bela descrição de Madrid. Merece ser visitada pela sua história e pelo acervo Cultural que possui.
    Sem falar das deliciosas iguarias.
    Est á anotada sua recomendação.
    Abraços Emílio Gonzalo e Tânia.

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