segunda-feira, 3 de abril de 2017

EURO 60 ANOS


A Europa tenta, mas a festa está desanimada. O aniversário de 60 anos do Mercado Comum está mais para ressaca do que para confraternizações, tem mais gosto de sopa fria do que foie-gras.

O sonho vem de longe. Romanos, Napoleão e até Hitler acalentaram a miragem de um continente unido, embora todos eles o imaginassem subjugado pela força, debaixo de espadas e botas, vassalo de um poder dominador.

Depois de séculos de querelas e desavenças, com conflitos que chegaram a durar cem anos e das duas recentes catástrofes das guerras mundiais, a ideia de esquecer os ódios e as invejas, e unir esforços numa comunidade econômica única começou a tomar corpo logo após a Segunda Grande Guerra. O quadro geopolítico do pós-guerra, que a espremia no empurra-empurra entre Estados Unidos e União Soviética, convenceu a Europa que só formando um bloco iria conseguir sobreviver.

A iniciativa foi celebrada por todos e, em 1957, o primeiro grupo deu as mãos e abriu os braços para os vizinhos. Com o sucesso dos primeiros anos, tornou-se o sonho de consumo das democracias europeias entrar para o clube. Um mesmo mercado, um continente sem fronteiras, uma mesma moeda. O que poderia ser melhor do que isto? Oportunidades de trabalho ao alcance da mão num território de repente vasto, sem os entraves das burocracias chatas dos permis de travail, uma viagem às deliciosas praias mediterrânicas sem o incômodo do câmbio e dos carimbos fronteiriços.

E então o clube começou a crescer. Eram os anos da bonança e ninguém reparou que juntar economias e culturas diferentes num mesmo cofre não era tão fácil como cantarem a mesma música num festival da Eurovisão. Ninguém também atentou para o fato de que só havia regras de ingresso. E se alguém quisesse sair? Nonsense. Prá que? Todo mundo só pensa em entrar... E muito país, cioso de seu passado, acabou vendendo seu futuro para tirar a carteirinha de sócio.

A hecatombe financeira de 2008 veio desafinar a música. Como se diz no nordeste brasileiro “pouca farinha, meu pirão primeiro...”. Da noite para o dia, o cofre descobriu-se cheio de papéis que a finesse dos analistas chamou de tóxicos, mas que a patuleia chama de cheque sem fundo. Muito sócio do clube havia assinado promessas que não podia mais cumprir.

Para fazer a tempestade “perfeita”, a primavera árabe desaguou num inverno interminável e o Islã fez o caminho inverso das Cruzadas. E aí, meus amigos, muita gente boa começou a procurar a rota de fuga. Ontem mesmo, começou a tocar o réquiem de saída da Velha Albion. Alguém mais?

E é nesta rebordosa de problemas que o Euromercado acende as velinhas. Uma história bonita, um começo fulgurante, um sonho lindo. Tem ainda chances de persistir? É claro que sim. Mas, terá de reinventar-se, reformular-se, dar a volta por cima. Como tudo neste mundo.

Oswaldo Pereira
Abril 2017



Um comentário:

  1. Foi um belo tempo. Eu me lembro de uma viagem e foi interessante passar por países
    que estavam em seus primeiros dias de Mercado Comum. Faltava até iogurte para o café da manhã....Mas como facilitava o viajar, foi um bom tempo .

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