quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

AULA DE HISTÓRIA





Como todo aluno do 4th grade (correspondente à nossa 4ª série do ensino fundamental) das escolas californianas, meu neto de 10 anos recebeu, neste mês de janeiro, a tarefa preparar um trabalho, que inclui a construção de uma maquete, a confecção de um poster com fotografias e ilustrações e um texto explicativo, sobre uma das Missiones. E eu, claro, como avô, fui logo convocado para trabalhar no projeto.

Para entender bem do que se trata, as Missiones constituem um importante capítulo na história cultural da Califórnia. Construídos entre 1769 e 1823, salpicando a costa ocidental da América do Norte desde o sul de São Diego até ao norte de São Francisco, os 21 conglomerados demonstram o esforço dispendido pela Igreja Católica na tentativa de catequese da população indígena.

A região, na época, pertencia ao Reino de Espanha e era habitada por várias etnias dos pele vermelhas, cujos corações e mentes os frades franciscanos que para lá foram se dispuseram a conquistar. Com o objetivo de converter, educar e “civilizar” os índios, e prepará-los para o exercício de uma cidadania colonial, ou o que isso pudesse significar, os padres acabaram por introduzir na cultura nativa o plantio de frutas e vegetais, a criação de gado e, o que viria a ter um forte impacto nas hostes tribais, o cavalo.


Assim, uma Mission estendia-se como uma pequena aldeia, com igreja, escolas, armazéns, currais, hortas, pomares, lavouras, poços artesianos, praticamente autossuficientes e produtivas. Atraídos para este meio pela oratória e pela energia dos religiosos, os índios trabalhavam na construção dos templos e dos edifícios, cuidavam das plantações e dos animais. Em troca, dentro de uma disciplina monástica, recebiam educação religiosa e secular, além de comida e alojamento. Mas, não eram todos. Muitos não quiseram abrir mão de sua cultura e do seu espaço livre, em troca de uma fé que não entendiam e de uma subserviência que repudiavam.

Desta forma, o resultado final deste obra teve altos e baixos. Como tudo. Com a independência do México, do qual a Alta Califórnia era parte, os padres espanhóis perderam o apoio. Aos pouco, muitas Missões foram abandonadas, suas terras sendo absorvidas lentamente nos ranchos dos californios, os californianos que falavam espanhol. A maior mudança, entretanto, veio em 1848, quando a região integrou-se nos Estados Unidos e, especialmente, um ano depois, quando notícias sobre descoberta de importante veios de ouro deflagrou um dos maiores deslocamentos de gente da crônica americana – a gold rush de 1849. Por fim, muitos terrenos foram distribuídos pelo Governo a apoiadores políticos ou grandes fazendeiros. Alguns voltaram às mãos da Igreja.

Atualmente, entretanto, os lugares históricos de todas as vinte e uma missões estão conservados e fazem parte de um concorrido roteiro turístico cultural. E sua importância os insere no currículo escolar da Califórnia.

E então, a “equipe” familiar teve de se por em marcha. O que envolveu uma belíssima viagem até uma das missões para tomada de fotos, visita aos prédios antigos, absorção in loco da sua saga e de suas lições. A mim, coube trabalhar na montagem da maquete, que não pode utilizar nenhum recurso profissional. É só cola, papelão, tesoura, fita crepe, pincel e tinta. Uma linda aula de americanidade.

 SAN GABRIEL ARCÁNGEL: A MISSÃO ESCOLHIDA PARA O TRABALHO 

Todos os anos, milhões de meninos e meninas de 10 anos fazem esta mesma coisa. Assim se perpetua e se reverencia este capítulo do passado. Dá gosto ver como um país “moderno” como os Estados Unidos prioriza tanto em seu ensino o culto de sua História.

Não sei o que acontece aqui em Pindorama, mas desconfio, pelo que leio às vezes na imprensa, que a nossa História está desaparecendo nos ralos abertos por programas didáticos medíocres, professores mal pagos e mal preparados, política educacional equivocada ou mal intencionada, desprezo institucional e descaso generalizado. Nosso presente é o que é, nosso futuro está na balança. Se apagarmos o passado, o que restará?


Oswaldo Pereira
Janeiro 2016



11 comentários:

  1. Que liiiindo !!!!! Estou emocionada com o empenho e cumplicidade do avô neste trabalho tão edificante e maravilhoso !

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    1. Avô é para isto e mais... E nada supera a doce ventura de sê-lo...

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    2. Avô é para isto e mais... E nada supera a doce ventura de sê-lo...

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  2. Muito interessante!Aqui ,lá vamos fazendo alguma coisa depois de tanta coisa ter sido destruida...

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    1. Portugal é outro exemplo de preservação do passado digno de aplausos. Nós, aqui no Brasil, estamos na contramão...

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    2. Grande avô o neto vai reconhecer.
      Aqui faz-se qualquer coisa pela nossa História
      mas podia e devia ser melhor.
      Um abraço

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    3. Mesmo assim, Portugal é um exemplo que o Brasil deveria seguir. Grande abraço

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  3. Muito interessante!Aqui ,lá vamos fazendo alguma coisa depois de tanta coisa ter sido destruida...

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  4. Muito interessante!Aqui ,lá vamos fazendo alguma coisa depois de tanta coisa ter sido destruida...

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  5. Parabéns Oswaldo, a história e a "história de nossa vida. Aqui vmos construindo o Museu do "AMANHÃ" e o que colocar dentro? Só o Eduardo Paes deve saber. E, chamou um arquiteto caríssimo da Espanha. Abraço, Cleusa.

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    1. Precisamos, e muito, é de um Museu do Ontem. Sem ele, não há amanhã...

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