Maresia
Vento
molhado. Julho, ou seria agosto? Não se lembrava, mas era inverno. Dois anos? Buzinas
no sinal, apito do guarda, ronco de motor. A cabeça lateja. Céu de chumbo. Cheiro
de óleo queimado. Água de chuva, bicicleta na calçada. Ainda dói...
Ipanema
Pisca-pisca ligado. Suíte, por
favor. Deixa eu tomar um banho. Como se liga a TV? Presilha do sutiã, tesão,
cama redonda. Vai devagar amor... Bico do seio, calcinha lilás, calor úmido.
Nome do motel?
Tarde da noite. Ar condicionado. Teu
corpo é lindo. Vales e colinas. Não, aí não... Olhos fechados, cavalgada nas
estrelas. Eu te amo num gemido. Vamos dormir aqui?
Desculpe, atrasei. Edifício Avenida
Central. Ei, tio, vai graxa? Escada rolante. Prefiro bufê. Dois guaranás light.
Vitrinas, gente. Gente, vitrinas. Tenho que comprar um pen-drive. Que hora você
tem de voltar?
Claro ou escuro? Aqui tá quente. Menu, cardápio, batata frita,
pastéis de camarão. Mais um chopinho? Chuva de fim de tarde. Meu carro tá perto. Mesmo motel de ontem?
Bonita barraca. Areia, pedra, mar, frescobol.
E o céu. Que dia é esse... Eu trouxe cerveja. Sanduíche naturaaalll... vai
querer, meu nobre? Vou até a água. Beijo molhado. Sappore di sale. Me passa o bronzeador. Quer comer qualquer coisa?
Que leseira. Canga vermelha. Gosto
de você. Café? Mais um beijo. Outro. O pessoal tá olhando. Maquineta do cartão. Débito. Sopra uma brisa. São quase
sete. Vamos?
Oi, já tava dormindo? Bateria no fim. Se apagar, me liga pro fixo.
Saudade... Sirene lá na rua, claridade no quarto. Fantástico na TV. Tô te gostando pacas... Semana que acaba.
Semana que começa. Vamos nos ver na quarta?
Sussurros. Eu te amo, eu te amo...
Já é madrugada, amor. Não desliga não. Silêncio na rua. Tá indo tudo tão rápido. Pus o despertador para as seis e meia.
Então, boa noite. Te adoro. Pensa em mim?
Brinde. Um mês, querida.
Restaurante cheio. A carta de vinhos, por favor. Cestinha de pães, grissines
compridos e salgados. Vais mesmo querer couvert?
A nós! Balde de gelo suando frio.
Hiatos de silêncio. Voz alta na mesa do lado. Ontem, fui me inscrever naquela
academia. Olhar perdido. Estás muito quieta. Algum problema?
Puxa, faz uma semana que você não
liga. Lua no ceu, trilha de prata. Tenho trabalhado muito. Gente que caminha,
gente que corre. Gente que sonha com a paz do espelho de água. Você gosta mesmo
de comida árabe?
Quer andar um pouco? Uma nuvem
engole a lua. Não, estou cansada. Cristo iluminado de azul, suspenso no céu.
Morro dos Cabritos apagado e inerte. Quando te vejo de novo?
No momento, não posso atender.
Depois do sinal, deixe seu recado...
De novo?
Dez da noite. No momento, não
posso....
Vou desistir. Ligo amanhã. Que dia
é mesmo amanhã?
Manobreiro. Espera de mesa. Tem
cinco pessoas na frente, mas é rapidinho. Cê
não tava em casa na quinta de
noite. É... atrasei no trabalho. Tá com
fome?
Meia de alicci e meia de margarita,
OK? Barulho de copos, barulho de pratos, barulho de talheres, barulho de
barulho. Mãos frias. Que é que tá havendo?
Vento no mirante, começo da
Niemayer. Vou fazer uma viagem. Gaivota em vôo rasante, onda lambendo a pedra.
Não tinhas falado nada... Quando cê volta?
Tchau. Chuva fina. Vareta quebrada,
guarda-chuva de camelô. Te ligo antes de ir para o aeroporto. Reflexos de luz
na poça d´água. Tô te achando
distante. Liga não, quando eu voltar a gente se fala. Promete?
Oi. Já chamaram o vôo. Acho que
acabou. Não consegui dizer cara a cara. Não me espere. Te cuida.
Silêncio. Click...
Dois anos. É isso mesmo, dois anos. Ainda dói...
Março 2011
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