«Estou
cada vez mais encantada com Portugal...»
«Não me diga que
você vai ajudar a engrossar o êxodo de brasileiros para lá...»
«Ué...talvez.
Mas, não é sobre isto que eu queria falar. É sobre a notícia que li ontem. O
Reitor da Universidade de Coimbra proibiu a venda de carne vaca nas cantinas.
Não é fantástico?...»
«Fantástico?!
Bem, não vi nada de fantástico. Vai ver é porque servir bolinhos de tofu e
saladinhas deve sair mais barato aos cofres da Universidade do que bifes...»
«Deixe de ser o
cínico de sempre, Cezar. Não tem nada a ver com custos. É uma maneira de
reduzir o consumo carne bovina e ajudar o planeta. O metano liberado pelo gado vacum é um dos grandes poluidores da
atmosfera. O próprio governo português já tem planos de reduzir o rebanho do
país em 30% até 2050. De novo, não é fantástico?»
«Já vi
tudo, Antônia. Você continua a entrar nessa onda do apocalipse climático. Não vê que isto é uma grande bobagem? Mesmo
que Portugal mandasse matar todo o seu rebanho, isto seria cagagésimo da população mundial de bois e vacas. E os rebanhos da
Argentina, dos Estados Unidos? Não me consta que os argentinos estejam se
preparando para abolir a parillada,
ou os americanos o seu querido barbecue dominical. Para não falar na Índia, onde o animal
é sagrado. Centenas de milhões deles vagam livres e intocados pelo continente
indiano, a depositar suas fezes onde bem entendem. Que me perdoe o douto Reitor
de Coimbra, mas isto é inócuo.»
«Não
é. E é isto que você não entende. Não interessa a quantidade. É um exemplo. Uma
mensagem. Qualquer ajuda serve. Cada um tem de dar o seu contributo, mesmo
pequeno, para salvar a Terra.»
«Às
expensas do pobre estudante que vai ficar sem o seu prego na frigideira...»
«Ora,
se ele não pode passar sem isto, que vá ao restaurante mais próximo.»
«Não é
bem por aí, Antônia. As cantinas universitárias não são uma rede de lanchonetes
em que o gerente pode decidir o menu. Foram destinadas a prover refeição
subsidiada aos alunos. A maioria depende disto para manter seu parco orçamento
e tem direito a um cardápio que procure atender a todas as preferências.»
«Mesmo
que isto ponha em risco a humanidade?»
«Risco?!
Pelo amor dos meus gatinhos, que risco, Antônia? O grande poluidor não são nem
o gado e nem o metano. É o CO2. Noventa porcento da poluição atmosférica vêm da
queima de combustíveis fósseis. O problema não é a vaca. É o carro. São as
grandes centrais elétricas movidas a petróleo. E isto dentro o conceito
discutível de que a ação do homem é que está mudando o clima...»
«Como
é que é? Eu não acredito que você ainda tenha dúvidas sobre este assunto. Hoje
mesmo na ONU todos os dirigentes mundiais estão concentrados em encontrar
soluções que diminuam a agressão humana ao meio ambiente. E com os ouvidos
abertos à pregação justamente enfurecida daquela menina norueguesa...»
«Sueca.
Greta Thunberg é sueca. E, do meu ponto de vista, acho seu discurso meio exagerado.
É emoção demais, apelos demais, até tranças demais... Sei não...»
«Meu
Deus. Você está parecendo o Trump...»
«Não
estou querendo insinuar coisa alguma, mas a mãe dela é ativista da extrema
esquerda. Quem será que escreve os seus discursos?»
«E
qual é o problema? O que ela diz, com ou sem interesses por trás, é verdadeiro.
Algo tem de ser feito. E já.»
«Concordo.
Que tal voltar a incluir um lombinho de
vitela ao molho barbecue nos cardápios de Coimbra?...»
Oswaldo Pereira
Setembro 2019