domingo, 9 de junho de 2019

DESTINOS CERTOS: ESCÓCIA




O sol pouco aparece. E, quando o faz, nos acena de longe. O vento, este está sempre presente, o bastante para revoltar os cabelos e entortar guarda-chuvas mais baratos. E a chuva. No decorrer de uma típica hora primaveril escocesa, os três se vão revezar sucessivamente. Preparados para tudo, é assim que devemos andar pelas charmosas ruas de Edimburgo. A melhor previsão dos humores do tempo termina sempre com a palavra “mixed”. Ou seja, um pouco de tudo.

Mas, esta é a proposta. A capital e o país ficam melhor assim, emoldurados pelas nuvens eternas, molhados pela garoa fina que produz campos de um verde infinito, afagados pela ventania que serpenteia nas passagens estreitas e pelas praças. Assim é a Escócia, uma terra de tradições arraigadas em seus magníficos vales, de gente empedernida e forte como os rochedos de sua costa nortenha, de rebanhos em pastagens de infinita verdura, de uma história povoada de heróis e lendas.

E a história está em todo lugar por onde se ande.

Ocupada pelos romanos no século I, a região entrou na Idade Média povoada pelos celtas, cuja cultura predominou sobre a influência de algumas tribos menores e as sucessivas invasões viquingues. Mas foi a permanente turbulência de seus conflitos com os anglo-saxões ao sul que desenhou a principal característica de sua crônica medieval. Foram várias batalhas, vários confrontos, que eternizaram os nomes de William Wallace, de Robert the Bruce, de Rob Roy. A sua própria independência viu-se, às vezes, posta em causa pela rivalidade dos clãs. E pela disputa enraivecida entre Elizabeth I e Mary Stuart. Finalmente, no início do século XVIII, a Escócia uniu-se à Inglaterra na criação do Reino Unido. E lá está até hoje.

Edimburgo
CASTELO DE EDIMBURGO

Com cerca de 550 mil habitantes e uma área histórica concentrada, Edimbra, como a chamam os da terra, é uma cidade ideal para se andar a pé.  Da Princess Street, onde está o melhor da zona comercial, até a extensa rua chamada Royal Mile, é um pulo. E dali é só subir em direção ao Castelo. Construído em cima de um vulcão extinto chamado Castle Rock (e aí, galera do Game of Thrones, já viram onde George Martin foi buscar inspiração?), é o ícone turístico da cidade. Vale o passeio, a vista e a história encrustada nas pedras negras dos muros e das ameias. Dentro, estão dois museus militares e um memorial, testemunhas do envolvimento escocês nas batalhas travadas pelo Reino Unido. Só nas duas guerras mundiais, foram mortos mais de 180.000 filhos da terra.

Perto fica a impressionante Catedral de Saint Giles. Um pouco mais para leste, o Palácio de Holyrood, onde Mary Stuart viveu o período mais determinante de sua vida. Lá, ela tentou ser rainha. Não conseguiu. E, como ninguém é de ferro, depois de encharcados de história e salpicados pela chuva, nada melhor do que um acolhedor pub e um copo do supremo tesouro nacional. O whisky.

Esta mistura de cevada, água e fermento, processada por destilação, apareceu na Escócia lá pelo final do século XV. Seu primeiro registro é uma encomenda feita a um frei chamado John Cor para fabricar 500 garrafas de uisge beatha, o nome celta para água da vida. De início, só os mosteiros tinham autorização de produzir a bebida para uso medicinal. Entretanto, como o remédio era bom demais, logo um mercado mais imaginativo foi surgindo e os saxões, que não conseguiam falar corretamente uisge beatha (pronuncia-se uishguebau), o simplificaram para seu atual nome. Hoje, existem mais de 90 grandes destilarias na Escócia.  E um mercado planetário.

Highlands
A população da Escócia é de 5,4 milhões de habitantes, fortemente concentrada na parte central do país, no eixo Edimburgo/Glasgow. Isto faz com que nas outras regiões existam grandes espaços verdes. Viaja-se por largo tempo sem se ver uma povoação. Só pastagens. E ovelhas, carneiros e vacas.

Nas Highlands, as Terras Altas, que compõem a parte setentrional do país, não é diferente. Aí também estão os glens, os acentuados vales, desenhados entre picos sempre enevoados, que nos trazem os contos de clãs em eternas disputas territoriais, suas lendas medievais, seus castelos misteriosos, seu vento cortante. Também aí estão os lochs, os lagos de água impenetrável. É quase obrigatório um passeio de barco no Loch Ness e curtir a esperança de ver o mítico monstro emergir da superfície escura.

LOCH NESS

 Scottish Borders
É a região fronteiriça. Com a Inglaterra, claro. E, por isso mesmo, o cenário dos grandes conflitos dos escoceses com seus incômodos vizinhos. Como não há qualquer grande obstáculo natural entre os dois países, os embates eram frequentes, determinados pelo incessante desejo dos saxões em dominar o norte da ilha. No final do século XIII e no início do seguinte, este desejo era personificado pelo rei inglês Eduardo I. Mas, seus sonhos foram contrariados por dois legítimos heróis. William Wallace e Robert the Bruce. Nas batalhas de Sterling Bridge e Banockburn, os escoceses levaram a melhor e reafirmaram sua independência. Os sítios históricos estão abertos à visitação.

Se quisermos visitas mais amenas, há dois edifícios religiosos merecedores de uma vagarosa descoberta. Um, é a Capela de Rosslyn. Fundada em 1446 por Sir William St. Claire e dotada de um minucioso trabalho em pedra em seu interior, cheio de figuras intrigantes e de simbolismo quase esotérico, a capela ficou ainda mais famosa depois que o escritor Dan Brown a incluiu na parte final de seu livro “O Código Da Vinci”.
 
ROSSLYN CHAPEL
Outro, é a Abadia de Melrose, construída no início do século XII pelos monges cistercienses e onde foram enterrados vários reis escoceses. Afirmam que uma caixa contendo o coração de Robert the Bruce está lá. Em algum lugar.

Esta é a Escócia que vi. Um destino certo.

Oswaldo Pereira
Junho 2019

5 comentários:


  1. Dà vontade de visitar, com seu relato surpreendente!Abraços

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    1. Não deixe de ir. E informar o Departamento de Turismo escocês da minha propaganda gratuita.....

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  2. É o meu maior desejo atualmente. Vamos ver se consigo. Junho é a melhor época, certamente. Obrigada,

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