Sempre que possível, prefiro ver os fatos em primeira mão. Sabê-los por segundas vias nos impõe o risco de encontrá-los eivados de interpretações e adições daqueles que os repassam. É o velho quem conta um conto aumenta um ponto.
Por isso mesmo, resolvi assistir ao vivo
a atuação do Ministro da Justiça Sérgio Moro na Comissão de Constituição e
Justiça do Senado Federal. Apresentando-se de espontânea vontade, Moro suportou
as quase 10 horas da sabatina a que 43 senadores (mais da metade do Senado) o submeteram sobre o assunto que ocupou todas as atenções políticas na última
semana: a invasão dos celulares dos procuradores da Operação Lava-Jato, através
do aplicativo Telegram, pelo site de hackers profissionais chamado The
Intercept. Este site tem como administrador
o americano Glen Greewald, que foi parceiro de Edward Snowden no Wikileaks.
Esta violação teria revelado conversas
entre Moro, então juiz encarregado da Lava-Jato, e alguns procuradores, nas
quais ele fornecia sugestões de ação e instruções investigativas nos processos
da Operação, principalmente nos relacionados com a acusação a Lula da Silva.
Imediatamente, os partidários do
ex-Presidente irromperam num frenesi de declarações, qualificando as conversas
como um conluio criminoso entre juiz e agentes do processo e, indo mais além,
exigindo a demissão de Sérgio Moro, a anulação de todas as fases processuais e,
sonho de consumo da Esquerda brasileira, a libertação de Lula.
Numa atitude não muito comum, Sérgio
Moro ofereceu-se a ir ao Senado explicar-se. E de sua prestação, nesta
cansativa maratona de perguntas e respostas, pude constatar várias coisas
bastante esclarecedoras.
A primeira foi a distinta superioridade intelectual,
protocolar, republicana e objetiva de Moro sobre a grande maioria dos membros do
colegiado que o arguia. Alguns senadores foram grosseiramente agressivos,
outros até caricatos na sua falta de qualquer vislumbre de argumentação
racional.
Depois, a sua firmeza e serenidade na
recolocação do assunto nos seus devidos termos. A saber:
- as supostas gravações das aludidas
conversas foram obtidas por hackeamento de
telefones particulares de juízes e procuradores, o que, em qualquer país do mundo,
é crime. Só esta circunstância já seria suficiente para as invalidar, porque
obtidas ilegalmente, como prova;
- mesmo se admitidas, teriam elas de
passar por um crivo de verificação que confirmasse sua autenticidade. Até onde
se sabe, não há qualquer arquivo em audio,
e sim transcritos das conversas, o que suscita a dúvida se o que lá está
escrito corresponde à verdade.
Apesar disto, Moro, repetidamente,
declarou que, mesmo que essas
gravações fossem autênticas, não há nada em seu teor que configure qualquer
ilicitude, pois o direito processual brasileiro permite que, durante a fase de
instrução, juiz, procuradores e advogados de defesa troquem informações e
sugestões sobre o processo.
No seu açodamento, no bojo de uma tempestade
fabricada em copo d’água, a Esquerda pretendeu derrubar Moro com um tiro de festim.
Que saiu pela culatra. O Ministro da Justiça, nesta reunião no Senado, saiu
maior do que entrou. E vozes começaram a ser ouvidas de uma possível candidatura
Moro para 2022...
Um último adendo.
Não tenho nada contra ideologias. Como
formado em Direito e do signo de Libra, sou um ferrenho defensor da liberdade
de opinião e de escolha. Aceito, e até tenho vários grandes amigos que assim o
fazem, quem professa e crê no ideário social-comunista, embora pessoalmente tenha
eu uma convicção diferente. Mas, não posso deixar de me colocar contra a
postura que alguma Esquerda brasileira, principalmente na imprensa e da intelectualidade,
vem adotando na veiculação de sua ira e sua histeria no exterior. Como estou em
Portugal, tenho presenciado episódios em que informações mal-intencionadas e
fantasiosas são deliberadamente divulgadas, mostrando uma imagem distorcida,
tendenciosa e até grosseiramente falsa do nosso país. Exemplos?
No conceituado jornal O Expresso da semana passada, o não menos
conceituado colunista e escritor Miguel Sousa Tavares vociferou contra Sérgio
Moro por conta das denúncias acima comentadas, publicando que Moro “jaz soterrado sob um mar de lama que nenhum
Lava-Jato poderá limpar.” Fico
imaginando em que fonte Sousa Tavares terá ido beber para escrever uma
insanidade destas.
Outro dia, um sobrinho meu veio
informar-me ter ouvido de alguém que, no Brasil, a Polícia Federal estava
proibindo a emissão de passaportes para impedir a fuga de brasileiros para o
exterior. Coisa de loucos...
Acho que a Esquerda brasileira precisa
se reinventar. Se continuar neste processo de exercer oposição apenas como
vingança e como defesa cega de um governo enleado em propinodutos, vai afastar-se cada vez mais da realidade, correndo o
risco de se ver identificada com o crime e a corrupção.
Oswaldo
Pereira
Junho
2019