Já que acabou a mini “quarentena” de
três dias após o término do último episódio e que entrados estamos no período
aberto a spoilers, chegou a hora das
avaliações.
Como todos os meus parcos, mas abnegados,
leitores já sabem, eu fui (e sou), desde a primeira hora, um juramentado
seguidor da mais badalada série televisiva de todos os tempos. Assisti a todas
as temporadas (a maioria delas vi e revi) e li todos os cinco livros da obra
que as inspirou, A Song of Ice and Fire (Uma
Canção de Gelo e Fogo), magistralmente escrita pelo “bruxo” George R. R.
Martin.
Game
of Thrones bateu
todos os recordes de audiência em todo o planeta e conseguiu envolver milhões
de fãs na teia de um fervor quase religioso. Foram muitos os polos de atração.
Primeiro, o cenário. As brumas da Idade Média sempre tiveram seu lugar mágico
no imaginário das gentes, com seus castelos, reis, rainhas, duendes, cavalos e
lanças. GOT acontece numa Idade Média
milenar, desenrolada numa tapeçaria de brasões, cavaleiros, feiticeiras e
dragões. Depois, o fumegante caldeirão de conflitos humanos, onde uma luta
insana pelo Poder desperta toda a gama de sentimentos, do amor ao ódio, da
lealdade à traição, da submissão à vingança. Em terceiro lugar, o roteiro rápido, de
diálogos candentes como flechas de fogo, a trama inquieta que aniquilava sem dó
nem piedade personagens pelos quais começávamos a torcer. A frase em
Alto-Valiriano, Valar Morghulis (todos
os homens devem morrer), uma espécie de mantra basilar da série, nunca foi
levada tão a sério. A seguir, jogue-se em cima disto tudo fartas doses de sexo,
onde abuso, incesto, prostituição e homossexualidade derramavam-se sobre a
linha mestra da história como um complemento natural. Afinal, era Idade Média
ou não? Finalmente, amarre-se este pacote todo numa embalagem visual jamais
vista num trabalho para a telinha. A
Direção de Arte de Game of Thrones ganhou,
merecidamente, todos os prêmios à disposição. De cenas de alcova até os campos
de batalha, passando por desfiladeiros gelados, mares em procela, desertos de
pedra, campinas bucólicas, cidades entre muros e salões reais, imagens, cores e
detalhes contribuíram, e muito, para o monumental sucesso da produção.
E então, após 8 temporadas e nove anos,
eis-nos frente à frente com o episódio final. Os cellos da abertura pareceram até mais pesados e mais solenes que o
normal. Seria a derradeira vez que ouviríamos a vinheta musical no início de um
capítulo inédito.
Mas, antes de aí chegarmos, a oitava temporada
já havia causado torcidas de nariz. A rigor, desde quando os produtores David Benioff
e D. B. Weiss haviam ultrapassado o último livro escrito por Martin na sexta
temporada (Martin parou no quinto livro. Segundo ele próprio, por preguiça...),
que algumas tribos de seguidores já haviam reclamado. Agora, entretanto, as
vozes aumentaram. Acho natural. Ao longo de todos esses anos, cada um de nós
foi criando sua versão própria para o desfecho. E, à medida que o roteiro daí
se desviava, uma certa decepção cutucava a audiência.
Assim, mesmo tendo sentido um leve tremor
na minha fé de admirador em algumas cenas do quinto episódio (achei a luta
entre Jaime Lannister e Euron Greyjoy muito faroeste
demais e a reação final de Cersei meio incompatível com o caráter delineado
ao longo da trama), cheguei ao capítulo sexto com minha devoção intacta.
E não me arrependi.
Cheio de simbolismos (inclusive com a
engraçada apresentação de Samwell Tarly a Tyrion Lannister de um livro
intitulado A Song of Ice and Fire...)
e citações históricas (a cena de Daenerys Targaryen proclamando que iria
conquistar o mundo, de cima de um palanque e com os Imaculados formados
embaixo, enquanto uma chuva de cinzas cai, lembrando Hitler e os fornos
crematórios), o encerramento deu-se num tom intimista e solene. Se pensarmos
bem, cada um teve o destino que procurava ou merecia, inclusive a Mãe dos
Dragões. A cena final, com Arya Stark, talvez a personagem mais forte da saga,
partindo para o desconhecido e para o futuro é bastante emblemática. E abre a
porta para um universo de spinoffs.
Que, espero, não aconteçam. Acho que
George Martin pensa igual...
Oswaldo
Pereira
Maio
2019