Remakes &
Sequels. Bem
que a indústria do cinema podia criar esta categoria. Novas versões & 1, 2, 3 poderia ser a tradução livre. Já é um
gênero, dada a persistência com que cineastas, produtores e roteiristas têm-se
dedicado a revisitar ou estender temas e ideias de sucessos originais. A coisa
vem de longe, é verdade. O Ben-Hur de
Charlton Heston já foi um remake de
um homônimo do cinema mudo. Os Dez
Mandamentos, com o mesmo bíblico Heston, da década de 1950, uma refilmagem
de outro de trinta anos antes. A lista é longa. Os Três Mosqueteiros já teve mais de cinco repetições, King Kong outras quatro. Clássicos
qualificados de definitivos, como Psicose,
Os Sete Magníficos, O Destino do Poseidon
e O Dia do Chacal acabaram não
resistindo ao apetite dos renovadores e surgiram em nova roupagem. É como se
alguém se propusesse a novamente esculpir a Pietà
ou repintar a Noite Estrelada. Ou
seja, quase nunca dá certo.
No
terreno das sequências, a coisa melhora um pouco. Há vida para além de Rocky I, II, III etc., ou da alentada
família de super-heróis, um constante jorrar de sequelas que faz a festa do
pessoal da computação gráfica. Star Wars é
um exemplo de como uma ideia pode evoluir, decair e recuperar seu rumo. De Volta Para O Futuro fez três ótimos
capítulos e, com talvez apenas um “furo”, a saga dos Aliens está sendo bem contada.
Tudo
isso para chegar no Blade Runner 2049.
Logo
de saída, preciso esclarecer que o primeiro capítulo, de 1982, figura entre os
melhores filmes de ficção científica a que assisti. Quatorze anos depois de 2001 – Uma Odisseia no Espaço, a
realização de Riddley Scott (pouco conhecido então) bateu fundo. Na década de
1980, com os alertas de um futuro acossado pelas agressões ambientais, um mundo
distópico, cinzento, poluído e degradado podia ser vislumbrado para dali a 40
anos e a ambientação de um dia-a-dia do século XXI, com sua chuva negra, seus outdoors gigantescos e orientalizados,
seus carros voadores e a angústia depressiva flutuando num ar saturado
perfeitamente reconhecível como provável.
Mas
o meu fascínio veio da mensagem embutida no dilema dos Replicants. Construídos à perfeição, estavam fadados à precariedade
de uma vida curta. E isto havia sido o tema central de toda a minha revolta
contra o milagre da criação desde a
juventude. Por que havíamos sido dotados da miragem da fruição de uma
imortalidade terrena, se jamais iríamos ser capazes de tê-la? A forma poética
com que, ao final do filme, Roy Batty,
o replicante magistralmente interpretado por Rutger Hauer, homenageia a vida
enquanto ela se apaga para ele, permanece, para mim, como uma das mais lindas
cenas do cinema. (E com a música de
Vangelis ecoando ao fundo, é de arrepiar...)
Assim,
fui ver BR 2049 com uma pontinha de receio e desconfiança. Riddley Scott
deixara a batuta na mão de Dennis Villeneuve. Ryan Gosling era o novo caçador
de androides, Hans Zimmer substituíra Vangelis. E se tudo fosse um grande
equívoco?
Agora
sei que não é. O filme mantem a pegada apocalíptica
do primeiro e o tom certo da interpretação de Gosling ganha o dia. Trinta anos
à frente, Los Angeles adensa sua atmosfera brutal de cidade terminal e segue
como pano de fundo perfeito para a trama. A toda hora, citações e simbolismos
premiam o espectador atento com verdadeiras joias escondidas no roteiro. E é
especialmente bem apanhada a cena de reaparecimento do velho Rick Deckard, um Harrison Ford bem temperado
pelos anos.
Nestas
décadas em que o primeiro Blade Runner virou
cult, a grande pergunta foi se Deckard era ou não androide. Para não
estragar a festa de quem ainda não assistiu ao 2049, apenas informo que esta dúvida
fica ainda mais alargada na presente produção. E a fina linha divisória entre replicantes e humanos torna-se ainda
mais tênue.
Mesmo
sem o lirismo do primeiro filme, o segundo merece elogios. Parece que não anda
bem nas bilheterias. Talvez vire, como o outro, cult. Mas é bom o bastante para sugerir que, daqui a mais 30 anos,
seja realizado um Blade Runner 2079. Quem
viver, verá...
Oswaldo Pereira
Outubro 2017