Não
sei se já aconteceu, mas, este ano, seis dos nove filmes candidatos à estatueta
são baseados em histórias reais. Só três (Her,
Gravity e Nebraska) têm roteiros
ficcionais. O que isto quer dizer? Não sei.
Mas
sei, e todo mundo sabe, que a indústria passa por um momento delicado. A
audiência está em declínio e salas de cinemas estão fechando em todo o mundo.
As mega distribuidoras estão tentando descontar o prejuízo explorando o filão
dos video clubes das TV a cabo, das edições em blue ray e em 3D, para assegurar o interesse de quem, refestelado
em seu sofá diante de um telão de 60 polegadas e cercado pelo surroundsound do seu home theatre, acha deveras incômodo sair
de casa numa noite chuvosa e ir enfrentar trânsito, fila e procura de vaga para
assistir a um filme. O grande problema é que a porta aberta da internet vem permitindo, com pequeno
esforço, zero risco e nenhum investimento, descarregar para qualquer hard disk menos nobre a cópia de segurança de uma obra cinematográfica
que pode ter custado dezenas de milhões de dólares para criar. Daí para um pen drive e para o escurinho de uma sala
de estar é um passo. Desde o aparecimento da televisão, nos anos 1950, que os
estúdios não enfrentam uma tempestade tão negra.
Nos
últimos anos, Hollywood e suas congêneres têm procurado enfrentar a tormenta
lançando blockbusters recheados de
mirabolantes efeitos especiais, na esperança de que o público se convença das
vantagens de assistí-los na tela grande e com som Dolby. Tem funcionado, mas,
não sei se porque o gênero começa a cansar, desta vez, nas muitas noites de
gala de premiação (SAG, BAFTA, Golden
Globe e, agora, o Oscar) houve
apenas um postulante que seguiu a linha, o realmente magnífico Gravity (sem dúvida, muito melhor visto
num bom cinema do que numa LCD...) Os outros se dedicam a dramas pessoais,
familiares ou políticos e usam mais a ilha de edição do que o estado da arte
dos visual effects.
Neste
ponto, é bom esclarecer que em termos de cinema, e como apanágio dos meus muitos anos, sou das antigas. Cresci flutuando na magia do celulóide, numa
época em que ir ver um filme era uma epopéia em si mesma, num tempo em que
algumas salas exigiam gravatas e vestidos de soirée, havia intervalos ao som de pianos ao vivo e poltronas de
veludo. Amo a tela grande e, evidentemente, preparo-me com preceito e
ritualístico fervor para a noite dos
Academy Awards, e não há Carnaval nem desfile de escolas de samba que me
desvie de assistí-la.
À
exceção de Nebraska, vi todos os
candidatos. E, como todo bom cinéfilo, tenho os meus vencedores. Para mim, the
Oscar goes to...
Filme: DALLAS
BUYERS CLUB
Diretor: Alfonso
Cuarón (Gravity)
Ator: Matthew
McConaughey (Dallas Buyers Club)
Atriz: Meryl
Streep (August: Osage County)
Ator Coadjuvante: Jared
Leto (Dallas Buyers Club)
Atriz
Coadjuvante: Julia Roberts
(August: Osage County)
Não
quero, entretanto, ser dono da verdade. Resolvi então pedir à Turma do Bar (aquela, cujos papos às vezes aparecem nestas páginas) para
também dar sua opinião.
“Melhor filme? The
Wolf of Wall Street, claro! Scorcese botou prá quebrar, jogou na cara de todo o mundo
o bas-fond do inacreditável universo financeiro americano, o imenso poder dos
manipuladores do mercado de ações, onde se fazem e desfazem fortunas
incalculáveis a partir do nada. Um grande alerta para a populaça que ainda crê
no jogo limpo e transparente dos analistas, das corretoras e dos xerifes das
agências reguladoras. Jordan Belfort contou tudinho no seu livro e Leo di
Caprio incorporou a sua ganância nua e crua numa interpretação poderosa. Oscar
também para ele, para o Diretor e, last
but not least, para Jonah Hill, como
coadjuvante, que arrasa na pele do “escada” de Belfort. Cate Blanchett e Sally Hawkins, a dupla de Blue Jasmine, completam a minha lista.”
“Adoro
cinema. Mas, não este cinema pasteurizado de Hollywood. Sou fã dos grandes
mestres europeus, da poesia dos japoneses, dos recentes iranianos. Filmes cabeça, por que não? É a arte mostrando
a vida como ela é, trazendo mensagens, histórias de carne e osso. Soube que o
Grupo Estação vai fechar. Temos de impedir uma tragédia destas! É o último
baluarte do cinema de qualidade. Sem ele, só nos restará o “circuitão”... De
qualquer maneira, fui ver os candidatos (não posso negar que a cerimônia do
Oscar tem a sua magia) e amei Philomena. Judi
Dench tem de levar a estatueta. No mais, achei Christian Bale que, além de gato é um verdadeiro camaleão, ótimo em American
Hustle. No mais, prefiro dar os meus palpites para o Urso de Berlim ou a
Palma de Cannes...”
“12 Anos Escravo merece o prêmio. E o
Diretor Steve McQueen também. Aliás, todos eles, Chiwetell Ejiofor, Lupita
Nyong’o. É preciso nunca deixar morrer a história da raça negra escravizada nas
Américas. Aquilo é que foi genocídio, físico e moral. Um genocídio que se
perpetuou e se repete no preconceito, na intolerância, na discriminação. Como
ator coadjuvante, ainda coloco o somali Barkhad Abdi, impressionante em Captain Phillips. Se a Academia tiver um
grão de coragem, vai homenagear estes grandes atores negros. Black is Beautiful!”
Vamos
conferir domingo próximo.
Oswaldo
Pereira
Fevereiro
2014