O conceito era
difícil de ser apreendido. Para o aluno de Catecismo que eu era nos meus sete
anos, o significado da palavra ETERNIDADE não encontrava ressonância em nada do
que eu conhecia. O mundo, suas coisas e suas gentes eram finitas, tinham prazo
de vencimento. Frutas estragavam-se, plantas feneciam, brinquedos quebravam,
pessoas, mesmo as mais queridas, morriam.
Até a imensa casa onde morávamos, em Botafogo, poderia um dia sucumbir
ao boom imobiliário do Rio de Janeiro
e transformar-se num espigão de concreto, como alguns que já se erguiam
triunfantes no bairro. Tudo o que eu via, sentia, provava e absorvia tinha fim.
Certo dia, sentindo a
impossibilidade didática de encaixar a palavra na minha relutante cabeça, a
professora de Religião usou uma linda parábola.
Imagine,
disse
ela, que o mundo todo, com seus
continentes, mares, cidades, montanhas, campos, desertos, rios, todos os
habitantes e seus bens, se transformasse de repente em mármore. Tudo,
transformado numa gigantesca bola de mármore. E que, de cinco mil em cinco mil
anos, viesse um pássaro e batesse com a ponta de seu bico em qualquer parte
desta bola, causando um infinitésimo desgaste no mármore. Imagine, então,
quanto tempo levaria para que esta enorme bola se desgastasse totalmente...
Bem, isto é quase nada, comparado com a ETERNIDADE.
E aí, o conceito
entrou. Aos sete anos, dava agora para eu sentir
a imensidão daquela coisa que nos era prometida na outra vida, a vida
ETERNA. Nesta vida, a terrena, entretanto, não havia problemas. Tudo tinha
mesmo começo, meio e fim, da barata que assustava minha mãe até o universo e
suas estrelas.
Até recentemente.
Aceita durante quase
um século como a mais provável explicação do surgimento de tudo o que aí está,
a teoria do Big Bang vem sofrendo sistemático
ataque de um respeitado grupo de cientistas. O bichinho das clássicas perguntas
de onde viemos? e para onde vamos? não cessa de inquietar o meio acadêmico, como
se da solução desta charada dependesse a felicidade de toda a Terra. E esses
luminares vêm agora com uma alternativa no mínimo inquietante. A de que o
universo não teve começo. Em outras palavras, ele SEMPRE EXISTIU. E,
consequentemente, como corolário, SEMPRE EXISTIRÁ.
E aí estou eu outra
vez às voltas com o velho conceito da ETERNIDADE, que comprei aos sete anos
como um apanágio da vida após a morte, no território etéreo do além. Como
encaixá-lo neste lado de cá, feudo das baratas e das estrelas? Como entendê-lo
matéria, reciclando-se num moto contínuo que nunca teve início, sem ponto de
partida, sem impulso primitivo?
É preciso ter
neurônios novinhos em folha para encarar mais esta. Nas aulas de Catecismo eu
ainda os tinha. Hoje...
Oswaldo Pereira
Abril 2015
Oswaldo. Muito me surpreendeu, a partir da imagem do " desenho " da ideia de Eternidade o oito deitado com o que vc ilustrou seu texto, verificar a semelhança desta c um conceito usado pela psicanálise mais atual; ou seja: a banda de Möbius. Procure na internet e vc terá um abordagem e uma dimensão bastante reveladoras sobre continuum não so do Universo como tambem dos processos e dos artficios da mente. Pra sua cabeca especulativa pode vir a ser um prazer tomar conhecimento deste vies do pensamento moderno. Abraço. Claudia
ResponderExcluirClaudia, você acertou. Isto é mesmo um Mobius strip. Como os desenhos de Escher, instigam a procura pela fusão das sensações de paz e angústia, algo que certamente irá fundir meus circuitos antes que lá chegue.
ExcluirQue nada. Pensar é muuuito mais revigorante que caminhadas escaldantes. Revigora. Alegra.
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